De pouco serve falar bem…

Entramos na área da feira logo que permitiram o acesso. Era por volta das 10h. Um dos orientadores do estacionamento nos conduziu até os fundos do centro de eventos onde estacionamos num local tranquilo. O acesso ao pavilhão foi trás. Assim, fizemos o caminho contrário daquele feito pela grande maioria dos visitantes. No final do pavilhão os estandes ainda estava sendo abertos e os responsáveis estavam chegando. Inicialmente o ambiente estava bem calmo. Enfim, era uma feira setorizada que, normalmente, não tem um público muito intenso. Fomos avançando, olhando os estandes, identificando as empresas que estavam na feira, os produtos e as soluções oferecidas, detendo-nos naqueles que nos interessavam. Assim seguimos até que chegamos quase na metade da feira vindo da parte detrás. Conforme fomos avançando o público aumentou. Também a postura dos vendedores nos pareceu que revelava uma agressividade cada vez maior. Paramos num estande que nos interessava. Começamos ouvindo a explicação sobre o produto que nós já conhecíamos. Interrompi o discurso ensaiado do vendedor para perguntar diretamente, Afinal, quanto custa?Ele parece que não me escutou e continuou falando dos benefícios do seu produto. Começava a nos irritar. Nós o ouvimos por educação. Já não o escutávamos mais. Particularmente eu começava a ficar aflito. Olhei em frente e vi o vendedor do concorrente direto do expositor onde estávamos, observando-nos. Estava impaciente. Quando finalmente conseguimos nos desvencilhar do vendedor, sem saber o preço, vi de canto de olho que o vendedor seguinte já havia separado o material sobre o seu produto, que nós também já conhecíamos. Certamente deve ter pensado que se nos interessava o produto do concorrente o seu também deveria nos interessar… Resolvemos dobrar a esquina da feira. Fomos abordados por outro vendedor. Seguimos em frente. O movimento aumentava. Os vendedores e representantes nos abordavam aos borbotões. Mas não era uma abordagem salutar. Era invasiva, por vezes até grosseira. Nós já não sabíamos para onde ir. Não podíamos ficar em frente de um estande e simplesmente a olhar e a conversar entre nós para analisar se iríamos entrar ou não. Os vendedores não permitiam. Falei para a minha esposa, Chega, vamos embora…

Quem visita uma feira setorizada, normalmente, tem interesse e conhecimento muito maior naquilo que está em exposição em comparação com uma feira aberta ao público. Seguramente tem produtos que não se conhece, assim como novidades desenvolvidas para aqueles que já são familiares. Também se imagina que os vendedores sejam especializados nos produtos que oferecem, uma vez que são produtores e fornecedores vendendo para outros produtores e fornecedores. Não era uma feira para o consumidor final, com raras exceções. Desse modo, o conhecimento técnico profundo sobre o que se oferece é fundamental. Não foi disso que nos ressentimos na feira que visitamos. Ressentimo-nos foi da falta de preparo comportamental daqueles técnicos. Passou-nos a impressão de que tiveram uma ou duas aulas sobre técnicas de vendas e as puseram em prática com quem passava a sua frente. Devem ter ouvido que deveriam ser agressivos. Também devem ter sido alertados que em primeiro plano é necessário falar sobre os benefícios que o produto tem em relação aos demais que estão no mercado. É obrigatório descrever as características técnicas inovadoras antes de qualquer menção aos valores. Por fim, devem ter recebido a instrução reforçada de que somente se fala no preço ao final da exposição. Pareceu-nos, assim, que aos vendedores somente lhes foi ensinado falar. Eles tinham todas as informações na ponta da língua. Falavam muito bem. Descreviam tecnicamente os produtos com toda propriedade. Todavia, a impressão foi a de que os vendedores não aprenderam a escutar. Até ouviam uma pergunta ou outra para a qual tinham respostas, entretanto não sabiam escutar. Não sabiam que a comunicação somente é validada se alguém realmente escuta aquilo que se fala, assim como aquilo que não se fala. Inicialmente nós os ouvíamos escutando. Passado um instante somente os ouvíamos, porque os vendedores não escutavam as nossas dúvidas que se transformavam em impaciência. Não escutavam as nossas expressões que revelavam uma agonia desmedida. Os vendedores altamente técnicos não escutavam os gritos que nós como clientes dávamos com nossa linguagem corporal.

Por isso, de pouco serve falar bem se você não souber escutar melhor ainda. Para vender, muito mais do que falar, é necessário saber escutar, porque a comunicação apenas se concretiza no ato da escuta. E sem comunicação não há venda. 

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