Estava esperando e, sem querer, comecei a ouvir a conversa. Ouvia o diálogo entre dois jovens que naquele dia se formavam no curso técnico. Estávamos no espaço em frente ao local onde fora realizada a solenidade de formatura. Eles observavam um carro muito bonito que estava estacionado ali próximo. Um deles disse:
– Cara, é o carro do meus sonhos. Um dia ainda vou ter um…
O outro respondeu:
– É, mas vai ter que ralar um bocado pra chegar lá, né?
A tréplica me deixou estarrecido:
– Nem tanto assim. Deixa eu arrumar um emprego e trabalhar uns dois ou três anos. Depois eu meto a empresa no pau e arranco grana pra comprar o bichinho.
Disse isso com a maior naturalidade, exibindo um sorriso que demonstrava toda a nossa cultura de levar vantagem em tudo. Deixava transparecer aquele sentimento de ser dono de si, vendo o seu interlocutor como um trouxa. E não é ficção. É fato. Olhei para os dois que conversavam, agora observando-os. Não pude deixar de ouvir. Não tive peito nem coragem para intervir ou dizer algo. Fiquei chocado e me pus a pensar, O que leva um jovem formando num curso técnico, com boas perspectivas de carreira, ter um pensamento tão medíocre?Ainda hoje me pergunto e não encontro uma resposta que pudesse justificar tamanha pequenez de raciocínio. Seria o resultado daquilo que se aprende no ambiente familiar? Em parte deve ser. Estaria subjacente nessa ideia uma falha no sistema educacional? Também é possível. Poderia ser a influência do ambiente político nacional? Talvez, mas é muito mais provável que o sistema político realmente seja a nossa representação…
Também se poderia pensar que existem muitos empregadores exploradores, não deixando outra alternativa a não ser essa para que as pessoas alcancem o que desejam. Certamente empregadores maus caráteres existem na mesma proporção como os do exemplo acima. Então como se pode sair do círculo vicioso em que estamos mergulhados como povo se não há o mínimo pudor em se revelar desonesto? Não se trata de estar de um lado ou de outro. Estar no papel de empregador ou empregado é circunstancial. Posso estar num ou noutro lugar em diferentes momentos Porém, ser conscientemente honesto ou desonesto é questão de escolha. Eis o ponto.
De que lado você está?