Sempre que leio uma autobiografia de um grande executivo ou de alguém famoso encontro a linda história de uma pessoa quase perfeita. As dificuldades, a superação e o sucesso alcançado. Momentos marcantes que foram determinados pela fibra, pelo empreendedorismo e pela resiliência daquele que conta a sua própria história, sempre pautados por um comportamento ético e impecável. Isso é o que as pessoas escrevem. Isso é o que elas contam. Porém, sabe-se que nem sempre é assim.
Muitos dos grandes exemplos de autobiografias que foram sucessos editoriais lutam para manter oculta alguma biografia não autorizada na qual parte de uma história não contada viria à tona. Por que é assim? Porque os grandes nomes que despertam o interesse para que pessoas comuns como nós comprem a sua história não são tolos a ponto de revelar as suas fraquezas na sua trajetória. Muitas vezes, fazem-nos sentir pequenos.Não me refiro a admitir a presença do medo ou as dúvidas em momentos de tomada de decisão. Refiro-me às falhas de caráter, como as pequenas e grandes trapaças que muitos ocultam no seu caminho para o sucesso. Poderia ser o simples fato de abrir a correspondência do colega que lhe revelou uma oportunidade que não era sua. Poderia ser a ideia copiada de uma conversa despretensiosa com alguém conhecido ou desconhecido num evento. Refiro-me também às pessoas que não foram e jamais serão reconhecidas como importantes nesse caminho. Poderia ser o porteiro que facilitou o primeiro encontro com alguém que o encaminhou para a pessoa que lhe abriu portas. Poderia ser a secretária que, por algum motivo, deu-lhe uma brecha na agenda do chefe. Poderia ser o cancelamento da apresentação de alguém que teve um imprevisto. Enfim, são muitas as situações que já não estão mais na memória daqueles que contam a sua história de sucesso. Refiro-me à pura sorte da qual muitos deles foram beneficiários, assim como de outros elementos fora de seu controle que os afetaram positivamente. Muitas vezes não há como explicar e os autores não explicam, ocultam. Habituaram-se ao sucesso e já não têm nenhuma importância no momento de relembrar o caminho do anonimato ao estrelato. Eles têm a receita para o sucesso. Alguns o fazem por má fé. Outros o fazem por pura ignorância ao acreditar que eles são o resultado único e exclusivo da sua força de vontade e da sua dedicação. Por isso, cuidado ao ler autobiografias de pessoas famosas. Não se sinta diminuído. Sinta-se grande, porque você, assim como os famosos, na hora de dormir vai dormir consigo mesmo e não com a imagem que passa.
O que quero dizer com isso? Quero dizer que toda a história vale a pena ser contada, desde que tenha valido a pena ser vivida. Famosa a pessoa ou não, conhecida a história ou não, não tem muita importância, porque quem determina o real valor dela é você. É você que vai conviver com as suas verdades e as suas mentiras. É você que saberá se o seu dia foi bem vivido ou não. Pode-se mentir num livro autobiográfico, dourando a pílula, omitindo questões delicadas ou até assumindo para si glórias que na realidade eram de outros. Tudo isso dificilmente será contestado num livro autobiográfico. Entretanto, ao mentir o livro passa do gênero de biografia para a ficção, que no meu olhar é onde a grande maioria das autobiografias deveriam ser enquadradas. E os famosos mentirosos precisam conviver com isso. Haja terapia, álcool e drogas para suportar a pressão da ficção assumida como realidade. Mas e nós, simples mortais, como vamos contar a nossa história? A nossa história será contada? Nós não podemos fazê-la virar ficção, porque simplesmente é a nossa vida. Se ela for contada ou não também é relativo, entretanto você saberá como ela foi vivida. Isso importa. Porque quando você encostar a cabeça no travesseiro você sabe o que foi real ou ilusão no seu dia. Você sabe quais os medos teve a coragem de desafiar e superar. Você sabe quais as tentações que teve a força de caráter necessária para suplantar, ou não… E o mais importante: você sabe quanta garra, determinação, resiliência, assertividade, alegria, humildade e gratidão foram investidos no seu dia para reconhecer que o esforço próprio é fundamental, porém a participação dos outros é indispensável.
Qual é a sua história?