Eram quatro horas da madrugada quando saí da casa do meus amigos para ir para a minha casa. Seriam mais ou menos novecentos metros rodando com a minha cadeira de rodas pelas ruas desertas da cidade. Cheguei na esquina da avenida, cruzei a primeira pista e parei no canteiro central para esperar um carro que por ali circulava. Vi que ele estacionou antes da faixa de pedestre no seu lado direito. Assim, aproveitei para cruzar a faixa da segunda pista que agora estava vazia. Observava a movimentação porque percebi que o carona saía do carro. Automaticamente um sinal de alerta foi ativado em minha mente. O rapaz vinha em minha direção. A primeira reação foi de medo, Esse cara vai me assaltar… pensei. Mas não havia muito o que fazer. Correr com a minha cadeira de rodas? Sem chances… Estava realmente preocupado, mas segui em frente. O rapaz me abordou:
– Ei, tá tudo bem? O senhor precisa de ajuda?
Fiquei imediatamente aliviado. Vindo de uma cultura em que a violência e a desumanização das pessoas tem sido um constante o oferecimento de ajuda de forma gratuita é inesperado. Logo, senti-me um pouco envergonhado por ter pensado mal de alguém que não conhecia. Em seguida respondi:
– Não, não. Tá tudo bem. Estou indo pra casa. Moro logo ali, quatrocentos metros em frente. Já tô quase lá…
– Mas o senhor quer que o levemos até a sua casa?
– Muito obrigado! Também estou aproveitando o passeio e a frescura da madrugada. Muito obrigado mesmo.
O rapaz, que tinha lá seus 25 anos, oferecia ajuda espontaneamente. Ele e seus amigos que ficaram no carro deveriam estar indo ou vinda de algo festa. Tiveram a percepção de parar e oferecer ajuda alguém que talvez pudesse precisar. Foi espetacular! Em seguida o jovem se despediu gentilmente, entrou no carro, acenou e foi embora.
Uma cena simples, mas para mim reveladora. Mostrou-me que as pessoas são boas, desde que sejam educadas para serem boas. Aquele rapaz certamente foi educado para ser bom. E é bom ser bom.
Ainda olhei para trás e vi o carro seguindo o seu caminho, enquanto eu seguia o meu. Cheguei em casa e dormi com a certeza de que o mundo pode ser um lugar melhor para se viver. E mais, fiquei com vontade de ser gentil também…