– Olha só, não tem vigilância nenhuma… É só colocar no bolso e levar. Ninguém vai ver.
O comentário e a ação me foram reveladas por um brasileiro que, assim como eu, mora temporariamente na Alemanha.
A realidade que aqui se apresenta é muito diferente daquela a que nos acostumamos no Brasil. No edifício onde moro não tem porteiro e não tem nenhum sistema de segurança. No transporte coletivo, inclusive adaptado para um usuário de cadeira de rodas como eu, não há roletas e nem cobrança de passagens. No supermercado aonde vou muitos produtos ficam expostos do lado de fora da porta sem nenhum tipo de vigilância. As pessoas, homens ou mulheres, costumam circular sozinhas em qualquer horário do dia ou da noite sem nenhum tipo de preocupação. Engraçado, não é? Para muitos brasileiros, isso parece ridículo. Como assim prédio sem porteiros, casas sem grades nas janelas, sem muros, sem câmeras de vigilância e sem aparatos de segurança? Por que simplesmente não se cogita entrar numa casa que não seja a sua e levar o que não lhe pertence. Transporte coletivo sem cobrador e sem roleta? É gratuito? Claro que não. Não passa pela cabeça de um cidadão alemão usar o serviço sem pagar, porque se não houver o pagamento um dia o serviço vai acabar. Todos sabem que não há almoço de graça. Produtos expostos sem vigilância? E as pessoas não os levam? Sim, elas escolhem os produtos e os levam até o caixa para pagar. É tão óbvio que se os produtos estão ali eles estão para serem vendidos e não para serem roubados. Circular sozinho de madrugada sem ser assaltado? Isso é possível? Também é óbvio que se alguém está na rua ela deve ter o seu direito de ir e vir respeitado e garantido pelo comportamento de todos. Tudo tão simples. Tudo tão lógico que não deveria ser surpresa nenhuma.
Para um cidadão alemão é surpreendente como alguém pode querer entrar numa casa que não é a sua; que pense em usar um serviço sem dar a contrapartida; que cogite em levar um produto sem pagar; ou que imagine roubar alguém simplesmente porque ele está sozinho. Eles não entendem e não veem isso como oportunidade. Para eles, nada mais falso do que o ditado de que a ocasião faz o ladrão. Aqui na Alemanha a ocasião simplesmente mostra quem é ladrão. E muitos por aqui têm se mostrado como são, inclusive brasileiros especialistas em levar vantagem. Não entendem que ao roubar dos outros simplesmente roubam de si.
Quando se invade, se tira proveito, se furta e se assalta a agressão não é somente para o outro. Cedo ou tarde a agressão se volta contra quem a pratica. Tudo fica mais caro. A rua fica mais perigosa. Por isso, o esperto rouba de todos e de si mesmo os benefícios de um ambiente seguro, assim como rouba a própria integridade e a honestidade que se espera de cada cidadão. Espero o dia em que nós, brasileiros, possamos visitar os países em que a segurança é algo natural e aprender que viver assim é muito mais “esperto”.
Para quem não é ladrão não há ocasião. Há o benefício de viver em paz!
Fonte: http://jairoaraujom.jusbrasil.com.br/artigos/115145225/a-ocasiao-faz-o-ladrao