Os novos velhos

Logo depois do enterro de meu pai nos reunimos na sua casa. Estavam presentes a esposa, os filhos, os netos e a enteada. Nós, os irmãos, fizemos uma rodada de lembranças das histórias vividas na nossa infância, adolescência e juventude em companhia do nosso pai. Histórias de um início difícil no interior de Toledo ainda sem estradas e sem energia. Histórias como as trapalhadas da queda de um cavalo ou quando ele foi atropelado por um novilho. Todos riam. A tristeza da partida deu lugar à alegria das boas lembranças. De repente o mais velho dos netos de meu pai olhou para o meu irmão mais velho e disse:
– É, agora você é o novo velho da família.

Olhou para o meu irmão mais novo e para mim e falou, rindo:
– Vocês são os novos velhos da família!

Entreolhamo-nos um pouco desnorteados, mas era a mais pura verdade. O falecimento do meu pai fechou um ciclo. Ele foi o último de um grupo de doze irmãos. A geração mais velha da família agora era a nossa. Não há novidade nisso, porque isso ocorre todos os dias em algum lugar do planeta com alguma família durante milhares de anos. Porém, cabe uma reflexão: qual o legado que os novos velhos deixarão?

A geração de meu pai deixou o seu legado, porque foi uma geração que trabalhou fundamentada em valores como integridade, tenacidade e honestidade. Vinham de gerações anteriores que lutavam contra a escassez de recursos e de tecnologias, mas desfrutavam da abundância da natureza. Ainda lutavam com a questão de sobrevivência da própria espécie humana. Traziam dentro de si a necessidade de ter filhos e de desenvolver a região. Cumpriram com o seu papel. Nós somos a geração que convive com a abundância de recursos e de tecnologia confrontados com o desaparecimento de elementos da natureza. Por isso, o desafio que a nós se coloca já não se trata de povoar e de desenvolver a região em termos de recursos, mas o de encontrar o equilíbrio entre os diferentes elementos comuns da nossa existência. Encontrar o equilíbrio entre a abundância de recursos e a sua distribuição, assim como com o desenvolvimento de tecnologias, o convívio harmônico com a natureza e o elemento espiritual.

A Páscoa se mostra um período propício para essa reflexão. É um momento em que muitas pessoas refletem um pouco mais profundamente sobre a vida e os seus desdobramentos. Nascemos, crescemos e partimos. Para onde? Isso é um mistério, mas para aqueles que têm a sua fé ela oferece uma resposta. Porém, não há mistério sobre aquilo que deixamos para as outras gerações. Isso é claro e transparente. Por isso a pergunta: qual o legado que os novos velhos deixarão? Equilíbrio? Entende-se que a Páscoa é um tempo de ressurreição segundo a fé cristã com relação ao espírito. Contudo, a ressurreição acontece de forma visível por meio da renovação natural das gerações. Vão uns, ficam outros. Por isso, também se deve renovar os propósitos que resultem em novas posturas e novos comportamentos para que possamos deixar o equilíbrio como nosso legado. Para encontrar o equilíbrio precisamos nos reinventar e ressurgir. É tempo de Páscoa. Os novos velhos precisam ressuscitar!

Feliz Páscoa!

Os novos velhos!

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