Outro dia fui ao teatro e para se chegar à sala de espetáculos tem uma longa rampa de acesso. Enquanto empurrava a minha cadeira de rodas rampa acima, uma mulher se aproximou e perguntou:’
– Você quer que eu o ajude?
– Não, não. Obrigado. A rampa é longa, mas bem tranquila. Muito obrigado!
E continuei a minha subida. Ao chegar no topo da rampa havia uma antessala, local que abriga exposições, antes da sala principal do teatro. Ali a mulher e eu continuamos a conversar. Foi quando ela me disse que, por vezes, ressente-se em oferecer ajuda, porque numa determinada situação em que ela o fez o cadeirante para quem ela ofereceu a ajuda a ofendeu.
Ela disse:
– Logo que ofereci ajuda ele passou a gritar, chamando a atenção de todos a volta, falando, “Quem você pensa que é? Você se acha superior a mim? Você acha que eu não consigo me virar sozinho? E se não tivesse ninguém aqui eu não poderia estar aqui?”…
Havia sido uma experiência muito desagradável. Ela teve vontade de sumir, porque todos os presentes voltaram o seu olhar para ela. Aquilo a havia deixado parcialmente traumatizada. Continuamos nossa conversa e ela demonstrou ser realmente uma pessoa agradável e não invasiva. Destaco aqui que também eu, como cadeirante, ressinto-me, por vezes, das pessoas invasivas que querem ajudar. Antes mesmo de saberem a resposta do indivíduo a quem oferecem ajuda, se ele aceita ou não, muitas vezes, já vão colocando a mão na cadeira e empurrando sem mesmo saber se a pessoa quer ir para onde eles a empurram. Para ajudar é preciso saber como ajudar. Para ajudar é preciso saber se a pessoa quer ser ajudada. Para ajudar é preciso entender se a ajuda é realmente uma ajuda.
De todas as formas, acredito que o gesto de oferecer ajuda somente demonstra que o Ser Humano tem a sua parte boa por natureza. Também acredito que o gesto de recusar ajuda mostra a autonomia de quem não quer ou não precisa da ajuda e que a pessoa está bem da forma como está, ainda que seja uma forma diferente daquela de quem oferece a ajuda. Por outro lado, o fato de retrucar de forma mal-educada, ofendendo o outro, também mostra que nós, seres humanos, não somente temos a parte boa dentro de nós. Somos duais. Temos o outro lado. Entretanto, o que foi descrito acima mostra, principalmente, que ser bom ou educado não é uma prerrogativa de pessoas com ou sem deficiência, de ricos, de pobres, de brancos, de pretos ou de outra classificação qualquer que temos por hábito fazer. Ser bom e fazer o lado bom prevalecer é uma escolha individual.
Lodo depois, finalizei a nossa conversa dizendo para a minha nova amiga que apreciei muito o seu gesto de oferta de ajuda e que espero que ela continue a fazê-lo sempre que achar que alguém o necessita. Espero sinceramente que a falta de educação de alguns não afete a vontade de ser bom da maioria. Por isso, nunca deixe a sua parte boa ser sufocada pela parte não tão boa de quem quer que seja. Como está a tua parte boa?
Bom Carnaval!!!
Moacir Rauber
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