Qual é o seu ritual preferido? O que ele produz?
Tenho muitos rituais incorporados no meu dia a dia. Alguns conscientes, outros nem tanto. Para dirigir, por exemplo, tenho toda uma sequência de movimentos que repito todas as vezes que eu utilizo o carro. Basta que eu me distraia e deixe de cumprir com um deles que tenho um pequeno momento de confusão. Esqueço-me onde deixei os óculos ou arranco sem estar com o cinto de segurança posto. Além de ser um ritual, trata-se de um procedimento que me ajuda a manter o foco naquilo que irei fazer. Esse é o papel do ritual para mim: manter o foco. Assim, entendo que no ritual a pessoa, inicialmente, para, olha para si, reconhece a sua dimensão, contextualiza, reflete e depois expande. No esporte, antes de remar, me alongo e nesse período me preparo mentalmente para o desafio. Na saída de casa me pergunto: para onde vou? O que preciso? Sempre que repito esse ritual consigo sair sem deixar a metade daquilo que preciso para trás. No retorno para casa me indago: o que levei? O que trago? Antes de entrar em casa faço uma limpeza emocional para não contaminar um ambiente que é sagrado para mim. Ao cumprir com esse ritual tenho um dia melhor com a minha família. Desse modo, sempre que sigo os rituais parece-me que tudo fica mais sereno, tranquilo e produtivo com relação aquilo que importa. Mas qual seria o meu ritual preferido? Entre todos os rituais, eu tenho um que especialmente me comove: a Santa Missa.
Para muitos pode parecer estranho, piegas e até pouco racional. Não me importa, porque o que importa que esse momento é importante para mim. Para os Católicos é o momento mais importante da profissão de fé, entretanto, para mim, esse momento representa os passos perfeitos de um ritual de expansão das possibilidades humanas de Ser Humano a partir da centelha divina que nos acompanha. Ao entrar numa igreja, parece-me ocorrer o contato direto com o sagrado. “Deus está em todas as partes” é certo, porém aquele espaço dedicado a Ele faz com que eu possa senti-Lo com mais profundidade. Escolher um espaço que nomeamos como sagrado para estar a próxima hora da vida me dá a devida dimensão humana de reconhecer-me pequeno diante dos mistérios da vida e do universo, ao mesmo tempo em que me valoriza com a importância da minha individualidade em toda a sua relevância. Somos pequenos, mas somos únicos. Assim, o universo somente é o que é porque nós estamos nele. Portanto, ao cruzar a porta de um igreja com a intenção de me por de joelhos diante daquilo que não entendo e fazer o Sinal da Cruz é um momento único. (1) Parar para despojar-me da falsa sensação de importância e reconhecer que a vida é muito maior do que o meu próprio umbigo é um exercício de humildade. Nem sempre é fácil. Pedir perdão por toda ação sem amor permite me (2) conectar com o outro na autêntica intenção de contribuir. “Senhor, tende piedade de nós. Cristo, tende piedade de nós. Senhor, tende piedade de nós”. Pode traduzir “Senhor” como queira, cosmos, universo ou energia superior, porém é um momento de reconhecimento de minha interdependência com algo que a minha limitada capacidade humana não permite entender. Não entender a amplitude daquilo que faço parte, entretanto saber que não estou à parte, faz a diferença para o momento seguinte, em que as leituras do Antigo e do Novo Testamento com os comentários feitos na homília pelo padre me chamam para a responsabilidade de contribuir ao (3) contextualizar a minha presença no mundo. “O mundo é melhor porque você está nele?” é uma pergunta subliminar presente em todas as falas dos padres que me levam a (4) refletir sobre o meu papel no mundo. Por fim, avança-se para o momento da consagração do pão e do vinho, um reconhecimento de que a vida é sagrada em todas as suas dimensões. Se a minha vida tem um valor inestimável a do outro também tem. Por isso, ao comungar com os demais tomo consciência de que eu sem o outro não tenho sentido. A última parte da Santa Missa é um convite para (5) agir e expandir. O Padre dá a benção e diz “Vão em Paz e que o Senhor os acompanhe” para fazer a diferença positivamente em um mundo do que qual faço parte. Qual será a minha ação? Qual é a minha intenção? Isso é comigo.
Enfim, entender os rituais para que as pessoas encontrem o sentido daquilo que fazem e do que acontece fará com que as famílias, a sociedade e as organizações tenham pessoas conscientes de seu papel. Rituais de passagem, de renovação, de integração ou de valorização são essenciais na vida familiar, social ou organizacional, porém é preciso observar e entender para avaliar se o ritual cumpre com a sua função. Quando você para, vocêse conecta de forma contextualizada? A sua reflexão tem levado a que você aja e se expanda? Enfim, dogmas a parte, o fundamental é entender que o único pecado na nossa humanidade é a ausência de amor nas ações e isso está dentro de cada um, nas intenções.
Moacir Rauber
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