PARO TUDO!
A candidata entrou e cumprimentou o entrevistador, sentando-se no lugar indicado. Ela já havia por outras etapas no processo seletivo e faltava a entrevista. A vaga exigia um alto nível de qualificação, uma vez que era numa empresa de tecnologia para desenvolver um produto inovador. A entrevista abordou aspectos técnicos daquilo que ela teria que desenvolver. A candidata, aparentemente, conhecia muito mais do que se esperava que conhecesse sobre a área. Mas conhecimentos técnicos tão somente não bastam. Precisa-se de algumas competências de comportamento humano, a resiliência, a empatia, a curiosidade, a compaixão e a compreensão, por exemplo. Os entrevistadores queriam ter uma ideia de como o futuro colaborador imagina que vá se comportar numa situação de estresse, de conflitos ou de pressão por resultados com prazos e indicadores de qualidade e produtividade. Por isso, um dos entrevistadores comentou sobre algumas típicas situações ocorridas na empresa e em seguida perguntou:
– Como você reage frente a um situação de muita pressão num ambiente stressante?
A entrevistada abriu bem os olhos, pensou um pouco e disse com a maior naturalidade:
– Eu paro tudo, saio correndo, dou um grito e volto…
A resposta foi diferente e inusitada. A área de Recursos Humanos é abundante em situações difíceis e também divertidas. Por um lado, são os contratos temporários que estão tomando conta de grande parte das relações de trabalho que terminam por nem serem relações. Não que eu seja contra contratar pessoas para desenvolver um determinado projeto com data de término de vínculo estipulada. Não é isso. No final, somos todos temporários. Sou contra a forma como se dá a relação com as pessoas que supostamente não trabalham para a empresa porque tem vínculo temporário. O comportamento demonstrado pelos que são efetivos (como se fosse possível) com relação àqueles que tem contrato por prazo determinado é mesquinho, porque os tratam como cidadãos de segunda classe. Da mesma forma, as entrevistas realizadas sem retorno para os candidatos me causam irritação, porque vejo que é um desrespeito para com as pessoas por trás dos candidatos. Sabe-se que as pessoas que estão se candidatando a uma vaga, normalmente, ficam ansiosas e querem mostrar o seu melhor. Geralmente são muitos candidatos para poucas vagas. São situações difíceis. Desse modo, aquele que tem a responsabilidade de fazer a entrevista deve ter em mente que a situação poderia ser inversa. O fato de agora estar entrevistando e não sendo entrevistado é simplesmente circunstancial.
Por outro lado, a área de RH tem momentos divertidos e fazer as entrevistas de seleção é um deles. A entrevista acima demonstra bem isso. Foi divertido ouvir a resposta e foi de fundamental importância o aprendizado que ele deixou. A resposta trazia na sua espontaneidade muita maturidade emocional para fazer dos conflitos e dos momentos de estresse uma oportunidade de crescimento. Nos dias de hoje são vendidos cursos para que as pessoas, diante de uma situação difícil, não reajam diretamente a ela. As orientações vindas das ciências comportamentais, como os estudos de inteligência emocional e psicologia positiva, ou das diferentes linhas de espiritualidade seguem na direção da atitude da entrevistada.
Nas ciências comportamentais, um exemplo vem da inteligência positiva. Ela sugere que se façam micro pausas para retomar o contato com a realidade e evitar os sabotadores internos e não reagir no modo automático ainda conectados ao instinto primitivo de sobrevivência. No campo da espiritualidade, o Novo Testamento traz inúmeros momentos em que pausas curtas e prolongadas são feitas para que as ações estejam alinhadas com as intenções. A pausa permite avaliar o que está acontecendo e somente depois tomar uma atitude. Exatamente o que a entrevistada fez.
Ela foi contratada!
Moacir Rauber
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