ACUSAR PARA SE ESCUSAR

Acusar para se desculpar…

A confusão estava armada. A incompetência mudava de lado conforme se alternavam os impropérios durante a discussão entre o entregador e o vendedor. O vendedor dizia:

– Não sabe ler? Aqui está a orientação ao produto que deveria ter sido entregue…

– Você é que não sabe escrever nem falar. Olha aqui… e o entregador mostrava um bilhete.

O cliente e o gerente presenciavam as trocas de acusações entre o vendedor e o entregador sobre a entrega do produto errado para o cliente. Ambos usavam a estratégia de acusar para se escusar (Pe. Checo). Quem estava certo ou errado? Nesse momento, não importava.

Entenda-se acusar como a expressão ou o julgamento moral negativo de outra pessoa ou de si mesmo e escusar como o ato de encontrar subterfúgios ou se desculpar por uma falha ou um equívoco. Dessa forma, ao acusar o outro a pessoa atribui, incrimina e censura num movimento de defesa, escusando-se da responsabilidade, da incumbência e da obrigação diante de uma situação. Nesse processo, trabalha-se com a culpa, um sentimento improdutivo e prejudicial em que ninguém assume a responsabilidade. De quem é a culpa? Uma pergunta que não contribui, porque tem embutida nela uma acusação que não leva a resolução do problema. Desse modo, o foco deveria ser numa pergunta que levasse a uma solução, a um aprendizado e a assunção de responsabilidade diante de um problema.

Ao buscar apoio na proposta de contato com a realidade da Inteligência Positiva e no passo a passo da Comunicação Não-Violenta, a sugestão seria a de se fazer uma (0) Pausa como um recurso para analisar a realidade com a objetividade de se ater aos fatos e não às interpretações deles. Em seguida, com a (1) observação fidedigna daquilo que ocorreu intuir os (2) sentimentos e identificar as (3) necessidades dos envolvidos na situação. A pausa permite que se conecte com a realidade, resgatando o sábio interior de cada um. Dessa forma, a (4) expressão se dá de maneira não agressiva, sem, contudo, ser passivo ou se esquivar do problema. É um caminho para a resolução de conflitos em que diminuímos os sabotadores internos que estão propensos a brigar, a fugir ou a paralisar. Traz-se para o comando da situação o sábio, que é otimista e consegue ver oportunidades em qualquer situação. Com isso, se poderia perguntar: o que aconteceu? Foi entregue o produto errado. O que pode ser feito para resolver a situação? Substituir o produto. Qual o aprendizado que a situação deixa? Revisar o processo. Avançar nesse passo a passo pode contribuir para que os conflitos sejam oportunidades de melhorar relações e processos, diminuindo as falhas. Assim, deixar-se levar pelos sabotadores para atribuir culpa, incriminar e censurar o outro para se escusar é contraproducente. Assim, é essencial parar, observar e atuar com a responsabilidade de se incumbir das próprias obrigações diante de uma situação, resolvendo os problemas.

O sábio do vendedor e do entregador estavam dominados pelos seus sabotadores, porém o gerente, inicialmente, calou-se. Os sabotadores do gerente igualmente existiam e seu primeiro impulso foi o de exercer a sua autoridade legítima para terminar com a confusão. Entretanto, ele fez a pausa que permitiu resgatar o seu sábio para analisar a situação e entender os fatos. Assim, ele pode empatizar com o vendedor, com o entregador e com o cliente para depois explorar a situação, navegar pelas alternativas, inovar nas soluções com a ativação do otimista que nele existia. Dessa maneira, ele ouviu, observou, respeitou, intuiu e agiu com respeito para com o entregador, o vendedor e o cliente. No final, o cliente saiu com o seu produto e o problema resolvido e com o vendedor e o entregador ele criou uma nova rotina, transformando uma situação conflituosa em oportunidade.

Enfim, os sábios são otimistas, não acusam e não se escusam. Igualmente, os sábios não são meros espectadores das crises, eles são os protagonistas das mudanças (Jorge Nardi).

E você, acusa para se escusar? Oxalá não, porque para isso já temos os políticos que o fazem muito bem.

Moacir Rauber

Blog: www.facetas.com.br

E-mail: mjrauber@gmail.com

Home: www.olhemaisumavez.com.br

2 comentários em “ACUSAR PARA SE ESCUSAR”

  1. Olá Moacir,
    Parabéns pelo texto!
    Quem sabe a tal “caça às bruxas” seja alimentada pelo medo da demissão, não importa o nível hierárquico…
    Simples seria se o mundo corporativo tomasse como exemplo a fase pós-projeto “lições aprendidas” de projetos de TI, oportunidade de ouro para melhoria contínua da empresa e das pessoas.
    No setor de aviação, isto é crítico porque envolve vidas. Como sempre insiste Joselito Sousa do “Aviões e Músicas”: um acidente serve, ao menos, para que a apuração de suas causas sirvam como oportunidade para melhorar os processos, e que tragédias decorrentes destas causas “nunca mais aconteçam”.
    Um abraço!
    Dênis Paschoalinoto.

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