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O preço do orgulho!

O preço do orgulho

 A vida era dura e as coisas não aconteciam com facilidade para ela. Cada sonho, toda busca ou qualquer conquista exigia um grande esforço. No entanto, ela se orgulhava de lutar pelo que queria com autonomia. O tempo passava rápido e ela não havia conseguido realizar uma de suas grandes ambições: a faculdade. Para conseguir ingressar numa universidade pública o conhecimento adquirido no Ensino Médio já estava muito distante. Dinheiro para fazer um cursinho nem pensar. Entrar numa universidade privada era uma possibilidade, porém a parte financeira era um empecilho. Ela vivia sozinha com a sua filha e o salário que recebia apenas cobria as necessidades básicas das duas. No seu trabalho, ela era dedicada, além de se envolver em atividades de voluntariado. Ela se orgulhava de poder ajudar. Um dia, conversando com a sua chefe, comentou sobre o sonho não realizado. A chefe disse que pagaria a universidade. Rapidamente ela recusou, dizendo que não era necessário, ao que a chefe respondeu:

– Não saber receber ajuda é uma das manifestações do orgulho…

Uma constatação verdadeira, porque o orgulho não somente se manifesta pela arrogância na interação com os demais. Ele está presente no excesso de autonomia e de independência que nos impedem de receber ajuda, um gesto de soberba ao crer que não se necessita dos outros. O provérbio português, “ninguém é tão pobre que não possa dar, nem tão rico que não precise receber”, retrata bem a interdependência humana. Todos podem dar algo. E ela entregava as suas competências no trabalho ao estar disponível para as atividades que eram parte de sua função. O ambiente que ela criava era positivo e propositivo. Ela ainda fazia os trabalhos voluntários ao ajudar a cuidar de idosos num lar próximo da sua casa. Não era porque a sua condição financeira não fosse das mais favoráveis que ela não poderia contribuir com algo além do seu trabalho. E ela o fazia acompanhada de sua filha. Porém, ao não querer ajuda, o orgulho se manifestava pela altivez ligada a soberba de se crer autônoma num mundo interdependente. Por que ela não queria que alguém lhe pagasse um curso universitário? Não saber receber ajuda pode ser soberba, orgulho ou arrogância e não sempre um exemplo de determinação pela autonomia. Dessa forma, muitos acreditam que se o orgulho de lutar pela autonomia pode representar a soberba, a virtude deve estar em seu antônimo, o outro extremo. Porém, o antônimo pode ser a submissão, o servilismo e até o puxa-saquismo, comportamentos que tampouco são positivos. Volta-se para o caminho do meio. Entre os extremos de orgulho e de submissão está a humildade, que é a virtude de saber se autoavaliar para reconhecer as fortalezas e as limitações, agindo em conformidade com elas. É a humildade no comportamento que permite que se interaja com os outros sem querer sobrepor-se ou se mostrar superior a eles. Enfim, creio que a virtude está no equilíbrio entre ser assertivo sem ser arrogante e ser humilde sem ser submisso. Assim, chega-se à harmonia.

Depois da conversa com a sua chefe, ela travou uma luta interna porque não havia gostado de ouvir que poderia estar sendo orgulhosa, arrogante e soberba ao não querer receber ajuda. Ela sempre lutara para manter a sua dignidade e se orgulhava disso. Entretanto, após os diálogos internos profundos ela conseguiu ver que a chefe tinha razão. Ela estava disposta a abrir-se para receber ajuda, porque o preço do orgulho, da soberba e da arrogância seria a não realização do sonho de fazer uma faculdade. Foi assim que ela se formou aos quarenta anos de idade.

Moacir Rauber

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Soberba ou Humildade: você está pronto para ser ajudado?

Ela estava desempregada, mas continuava a fazer seus trabalhos voluntários. Não reclamava, porém se questionava a razão de que a vida se mostrava tão dura. Um dia, após terminar o seu voluntariado no asilo, o padre que coordenava o local a chamou para conversar. Comentou de um curso que seria oferecido na paróquia e indagou se ela não gostaria de fazê-lo. Ela leu as informações e ficou interessada, porém não tinha dinheiro para fazer o curso. O padre se ofereceu para pagar o curso. Ela disse que não. O padre então lhe disse algo que a acompanha desde então:

– Minha filha, saber receber ajuda também é um ato de sabedoria. É uma benção. Ninguém é tão autossuficiente que não necessite da ajuda de outros, por isso, não aceitar ajuda pode ser a manifestação da soberba…

Ele ainda fez mais alguns comentários. Ela abaixou a cabeça e aceitou a oferta. A realização daquele curso mudou a sua vida, porque nunca mais ela ficou mais sem trabalho.

Soberba pode ser definida como sentimento de orgulho e de altivez que traz em si a arrogância e a presunção de estar num patamar superior aos demais que revela a prepotência. Alguém que não quer receber ajuda pode estar manifestando a prepotência de se crer numa posição superior de independência. É a soberba, porque somos interdependentes. Soberba é diferente da autonomia que, para mim, é uma luta.

Quero ter a autonomia de escolher aquilo que quero fazer, inclusive o ato de saber pedir ajuda.

No ambiente profissional isso é essencial, porque em todos os espaços sempre há alguém que sabe mais sobre um determinado assunto do que você. É fundamental não ser soberbo para aceitar. É preciso ter a humildade da autonomia para saber receber.

O que é humildade? A palavra representa a virtude de reconhecer as próprias limitações e os pontos de melhoria para poder agir a partir desta perspectiva e, ao aceitar, aprender. A humildade pode ser entendida como a naturalidade de reconhecer que não sabe para que se abram as portas das possibilidades da aprendizagem. Não é fraqueza não saber. Pode ser fraqueza acreditar que não se tem nada para aprender, quando a soberba o impede de dizer “não sei”. Essa também é uma luta pessoal minha, resultado de um rótulo que me acompanha desde criança, quando me diziam que eu era muito inteligente. Os pais, os amigos e os professores diziam. De repente, senti que deveria saber muito mais do que sabia pelo inteligente que os outros acreditavam que eu era.

Parei de perguntar. Parei de não saber. Terminei por parar de aprender. Era a soberba de acreditar que deveria saber que estava em mim.

Tive que desconstruir a minha soberba ao me dar conta de que para ampliar as expectativas precisava da humildade de saber receber ajuda de outros. É preciso ter a humildade da autonomia para saber aprender.

Portanto, entender os momentos em que se precisa de ajuda é um ato de humildade que permite ampliar as próprias perspectivas. Por isso, é essencial ser humilde sem ser submisso. É importante ser altivo sem ser arrogante. Para isso, não se precisa renunciar a autonomia pela humildade, assim como se pode mantê-la sem a prepotência. Enfim, diálogo inicial é simples, porém representativo poque ao receber a ajuda de que precisava mudou a sua vida e contribuiu para outras vidas. É a interdependência que acontece em todas as esferas de nossa convivência social. Nas amizades é muito bom dar e receber ajuda, porque são eles que nos dão e para quem damos alegrias e apoio em diferentes momentos. Nas relações familiares a ajuda é uma marca, porque quando não se tem mais ninguém é a família que conta. No ambiente profissional saber dar e receber é a marca do profissional competente e humanizado.

O profissional que sabe receber a contribuição dos outros compreende que nesse ato é o todo que sai engrandecido. Não é fraqueza. Também é imprescindível oferecer ajuda sem desrespeitar o trabalho e as competências do outro. Não é soberba. Em ambos os casos, é a humildade de se reconhecer interdependente.

Moacir Rauber

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O joelho não existe. E uma organização é real?

As conversas de senso comum são fascinantes. Um amigo meu, dono da verdade (não é a ciência) naquele momento diz:

– Tem gente que fala que operou o joelho, mas o joelho nem existe.

– Como assim? Perguntam os presentes.

– Se você separar o fêmur, a tíbia, a fíbula e a rótula não sobra nada. Na verdade, sobram os músculos e os ligamentos. O joelho é o ponto de encontro das partes…

Ele tinha razão. O joelho é uma invenção humana para denominar o ponto de encontro dos elementos concretos, como os ossos, os músculos e os ligamentos. Ao estender o raciocínio para uma empresa, uma igreja ou um time de futebol, eles também não existem. Todas as organizações sociais são apenas o ponto de encontro dos elementos concretos, os indivíduos que as compõem.

Uma empresa é onde as pessoas se encontram para que produzam produtos ou serviços. A empresa em si não existe, porque a construção, os equipamentos e os produtos não são a empresa. Uma igreja é o local onde as pessoas vão para manifestar a sua fé em algo que acreditam. Da mesma forma, a igreja em si não existe, porque ela não é a construção, os altares ou os bancos. Um time de futebol é a reunião de onze sujeitos que se encontram para buscar um objetivo articulado entre eles. De igual modo, o time em si não existe, porque ele não é o campo, o estádio ou a bola. Desse modo, toda e qualquer organização social não existe, sendo apenas um ponto de articulação entre as pessoas que têm interesses comuns.

Por um lado, o joelho somente existe quando as partes do corpo humano que o compõem se encontram. De outro lado, as organizações sociais precisam de pessoas que se encontrem para que existam. Porém, há uma grande diferença. O joelho, para existir, é composto por partes que não tem vontade nem autonomia. Elas simplesmente estão ali e basta o cérebro ordenar para que o joelho cumpra a sua função de articulação. As organizações, para existirem, são compostas por pessoas que têm vontade e autonomia e que podem escolher onde querem estar. E nesse ponto está o desafio cada vez maior de se ter organizações longevas. Não basta ter um cérebro para dar ordens. É preciso ter um líder que consiga identificar a missão organizacional, estipular uma visão e expressar valores que possam aglutinar a sua volta pessoas que queiram caminhar na mesma direção. A organização é o ponto de encontro e serve de articulação para todos. É o papel do líder construir uma organização que permita que as partes queiram estar onde estão, considerando que cada uma delas é diferente das demais. Desse modo, o líder deverá desenvolver habilidades sociais e competências emocionais que estimulem a que as demais pessoas queiram estar naquela organização, o ponto de encontro para a articulação de objetivos comuns. Parece pouco? É um grande desafio ser o gestor de uma organização que fora da realidade imaginada pelo ser humano não existe, mas que produz dores e alegrias reais nas pessoas que as compõem. Ao dissecarmos cada uma dessas organizações, analisando-as parte a parte, ou pessoa a pessoa, é possível entender a importância do engajamento de cada indivíduo para que ela exista. Caberá ao líder ter isso em mente.

Desse modo, toda empresa, igreja ou equipe de futebol depende de um movimento espontâneo e deliberado para existir. Isso requer articulação. Cabe, portanto, ao líder entender os desejos e as necessidades individuais para que cada integrante da organização se mantenha ativo num movimento articulado, seguindo na mesma direção. As pessoas, com as suas vontades, devem querer estar naquele joelho, ops, naquela organização.

É o papel do líder fazer com que a organização exista.

 

Moacir Rauber

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Deus não mata, mas castiga…

Hoje foi um daqueles dias estranhos. Saí pela manhã para deixar o carro para lavar e aproveitei para ir ao correio. Na rua encontrei um amigo que estava acompanhado de um amigo dele. Logo fui apresentado ao amigo do meu amigo:

– Olha, este é o Fulano, somos amigos desde a infância. Fizemos muitas festas juntos!

O amigo do meu amigo, vestindo um terno preto e uma pasta executiva nas mãos, estendeu-me a mão e disse:

– É, mas é passado… Aquele homem não existe mais. Foi parte do caminho para chegar até o Senhor Deus…

O meu amigo o interrompeu dizendo:

– Sim, hoje ele faz parte da igreja TAL (citou o nome de uma igreja que eu nunca ouvira falar).

Após ouvir o nome da sua igreja o amigo do meu amigo se sentiu à vontade para fazer o seu trabalho de evangelização. Embora a questão de permissão não seja nenhum empecilho para muitos dos novos convertidos, porque a grande maioria não está nenhum um pouco preocupada em ter licença ou anuência para falar. Muitos querem salvar o mundo obrigando os outros a aceitarem a sua verdade sem deixar espaço para as diferenças.

Ele continuava a sua pregação. A situação ficou um pouco embaraçosa e o meu amigo puxou outro assunto. Mas não foi o suficiente, porque em seguida o amigo do meu amigo interrompeu a conversa:

– Você usa cadeira… Qual é o seu problema?

A forma como fez a pergunta era quase uma acusação, pois parecia que me dizia que eu estava na cadeira por merecimento. Olhei-o nos olhos, antes de dizer, calmamente, que eu não tinha nenhum problema e que o uso da cadeira de rodas se deu em função de um acidente de trânsito. Foi então que veio a expressão mais assustadora que já ouvi:

– É, Deus não mata, mas castiga!

Fiquei paralisado. Não me refiro a paralisia física, mas sim ao que se passou na minha mente. O espanto e a incredulidade pela estupidez da fala foram tamanhas que não soube o que fazer. O nada absoluto tomou conta de mim. Talvez eu tenha pensado algo como, “Não, eu não estou ouvindo isso…”. Como cadeirante há mais de trinta anos já ouvi muitos comentários infelizes, porém nunca, nunca mesmo alguém me havia dito que o fato de estar numa cadeira de rodas fora um castigo divino. Quando retomei a consciência apenas me despedi e fui embora.

Fiquei confuso e atordoado por horas. Fui rodando com a minha cadeira de rodas pelas calçadas malconservadas da cidade. Desviava de um buraco e de outro num zigue zague maluco a que os cadeirantes estão obrigados quando querem circular pela maioria das cidades brasileiras. Cadeirantes não, segundo aquele sujeito, os amaldiçoados! Nada, absolutamente nada contra as pessoas terem a sua religião e as suas convicções, assim como o fato de ser uma religião mais antiga ou mais nova não faz a mínima diferença. Entendo que nem sempre o antigo nos garante que seja verdadeiro, assim como o novo não nos assegura que seja uma evolução. Espanta-me o fato de que apesar de toda a sua professada fé muitas pessoas não conseguem entender o verdadeiro milagre presente na benção da vida, ainda que se tenha limitações físicas ou intelectuais. O milagre da vida não se revela pelo fato de caminhar, de correr ou de falar bem. O milagre da vida se manifesta em saber viver bem com aquilo que se tem e com a satisfação das próprias conquistas.

Também fico assustado como o totalitarismo pode se expressar por meio de pensamentos tão tacanhos revestidos de mensagens divinas. Pensamentos em que não se reconhece a liberdade de que outros pensem e ajam de forma diferente. No mundo ideal do amigo do meu amigo todos deveriam seguir a sua lei, pois somente no dia em que todos pensarem de forma exatamente igual e seguirem a sua cartilha é que o mundo estará a salvo. Pergunto-me: a salvo de quem? Da diversidade? Das diferenças?

Imagem: Rastro Selvagem

 

Moacir Rauber

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Deixa pra lá…

Palestra  de lançamento do livro Ladrão de si mesmo. PARTICIPE!!!

A omissão é uma escolha. Não se omita. Compre as suas brigas e aprenda a dominar a sua mente. Só assim para ter a autonomia sobre os seus pensamentos e ações.
Omissão
As omissões, assim como as ações, produzem reflexos em cada um e também no meio em que se vive. Omitir-se é uma não ação que também produz resultados. Não deixe pra lá!


“Não sei cozinhar!” Como é que é?

– Não sei cozinhar!  Ouço muitas pessoas afirmarem isso com orgulho.

Pergunto-me: como é que pode alguém se sentir orgulhoso de não ser capaz de preparar a própria alimentação?

Alguns anos atrás essa expressão era quase que mandatária entre os homens, afinal eles eram os provedores dos recursos da casa. Por isso, tinham o “direito” a ter tudo à mão, como as roupas passadas, o quarto arrumado, a casa limpa e a comida sempre pronta. O prato preferido de segunda a segunda era obrigatório que estivesse bem preparado, na temperatura preferida e na textura determinada. Caso contrário era motivo de reclamação explícita, sem pudores ou temores de ofender quem o havia preparado. Ainda bem que esse tempo passou. Hoje, quase não há diferenças entre homens e mulheres quando o assunto é cozinha. Em muitas casas as cozinhas são comandadas exclusivamente por homens e em outras por mulheres. Em outras tantas casas por mulheres e por homens que dividem as tarefas, conciliando-as com a profissão e filhos, quando é o caso. Estranha-me, porém, nos dias de hoje, ouvir alguém dizer, homem ou mulher, com o peito estufado:
– Olha, não sei cozinhar nem um ovo. Se dependesse de mim para fazer a comida morreria de fome…

Isso me espanta. Involuntariamente pergunto, Como é que é? Voluntariamente repito a pergunta inicial: como é que pode alguém se orgulhar de não ser capaz de preparar a própria comida? Pelo orgulho com que o dizem parece até que consideram a atividade como indigna de sua grande capacidade. Seria algo depreciativo saber preparar a comida? No meu ponto de vista, essa incapacidade poderia ser comparada as situações em que não se é capaz de atender necessidades básicas, como tomar banho, escovar os dentes, pentear os cabelos ou fazer a barba. E há que se lembrar do grande número de pessoas que não cumprem tais atividades porque simplesmente não podem. E ainda assim, é preciso ouvir alguém se gabar de que é incompetente para preparar a sua comida? Sinceramente não entendo, porque a comida é um dos grandes prazeres do ser humano.


Fui criado num ambiente em que ainda essas atividades eram bem divididas. Homens cuidavam do serviço pesado no campo, no comércio ou na indústria. As mulheres faziam o serviço da casa. Mas a vida mudou. A realidade não é a mesma. Tenho orgulho em dizer que aprendi a cozinhar e se depender de mim quem for até a minha casa vai ter servida uma comida muito saborosa. Ora feita pela minha esposa. Ora feita por mim. Como é que é? É isso aí. Orgulho-me de saber cozinhar!

Fonte: http://www.bemparana.com.br/vossoblogdecomida/escoffianas-brasileiras/