Ele estava na sala preparando o material que levaria para doação. Era época de Natal e as boas ações sempre foram prioridade para ele. Embrulha daqui e arruma dali. Ao seu lado passa a esposa e derruba um dos objetos que ele havia separado. A bronca é rápida:
– Sai daqui! Não tá vendo que eu tô arrumando as coisas?
O diálogo apenas representa a ausência do diálogo naquela casa. A esposa se ressentia de que o marido não lhe dava atenção. O filho com seus dezessete anos já estava mais do que envolvido com bebidas e drogas. E o marido estava com todo o seu tempo empenhado nas ações de caridade e de amor ao próximo, desde que não fossem tão próximos. Durante o dia ele tinha a sua rotina de trabalho. À noite e nos finais de semana ele participava de associações de caridade que recolhiam fundos para as crianças carentes. Ele era membro efetivo de diferentes clubes e grupos de amigos que providenciavam suprimentos para clínicas de dependentes químicos. Eram todas boas ações em nome de uma sociedade melhor, mais humana e mais amorosa. E agora era Natal, um tempo especial em que as pessoas estão naturalmente mais carentes de amor. Ele entendia que precisava fazer a sua parte, por isso andava estressado ralhando com a esposa e sem saber o que fazia o filho. Isso é amor ao próximo?
Não há consenso sobre o que é amor. Para alguns o amor é um sentimento quase sempre relacionado com a paixão para com outra pessoa ou mesmo para com uma causa. Para outros o amor não é um sentimento, mas uma construção diária resultado de suas escolhas. Particularmente me alinho mais com aqueles que acreditam que o amor é uma construção, porque ela exige contato, esforço, dedicação e comprometimento por longos períodos. A paixão é fugaz, impulsiva e passageira. O amor é duradouro, paciente e exigente. O amor é a vontade de expandir-se por meio da construção de relações próximas e saudáveis. Porém, para se expandir é necessário possibilitar que o outro também cresça. No exemplo acima, onde está o amor?
Às vezes, é muito fácil enviar presentes para outros, mobilizar-se numa campanha e participar ativamente de uma causa. São atitudes necessárias para que realmente consigamos construir um mundo melhor e com mais amor. Porém, nem sempre essas atitudes representam o amor como uma construção. Na época de Natal, enviam-se presentes, cartões e reforçam-se os desejos de que o Natal seja maravilhoso e com muito amor. Onde está a dedicação nisso? No período natalino, mobilizam-se recursos para as pessoas carentes, lar de idosos e orfanatos. Nas justificativas internas cada um se diz, Eu abracei a causa! Fazem-se as doações e depois se volta para a ceia de Natal no aconchego do lar. Onde está o comprometimento nisso? Sem dedicação e sem comprometimento é fácil amar o próximo que não é próximo. No meu entendimento amor é construção. Construção exige contato e mão na massa. O esforço de aceitar o outro como um verdadeiro outro. E esse é o primeiro passo. Só assim para fazer as ações ao próprio alcance para amar um próximo não tão próximo e desenvolver a capacidade de amar o próximo mais próximo. Dar a devida atenção à esposa e entender as necessidades do filho é construção. Envolvê-los nos seus projetos de melhorar o mundo é construção. Isso é amor!
Você ama o próximo? É bom e importante amar o próximo, esteja ele longe ou próximo. Porém, é indispensável amar o próximo mais próximo, porque só assim todos os próximos serão amados pelos próximos, incluindo cada um. E amar o próximo que está próximo exige esforço e dedicação. É uma construção. Natal é tempo de amor, assim como todos os dias é tempo de amar. Acima de tudo, Natal é tempo de construir!
O que você está construindo?