Você fala tudo o que lhe vem à cabeça?
Ainda bem que está passando o período em que se incentivava a que todos dissessem tudo o que lhes vem à cabeça o tempo todo. Nas últimas décadas, algumas gerações foram educadas acreditando piamente que elas eram as mais lindas, as mais inteligentes e a mais talentosas pessoas que já pisaram na face do planeta. Em núcleos familiares cada vez menores, os pais diziam, “Você é um príncipe” ou “Você é uma rainha” incutindo na cabeça da criança que ela era a pessoa mais especial do mundo e que podia tudo porque todos estavam a sua disposição. Naquele pequeno reino familiar realmente era assim. Foi um movimento de oposição a um período anterior em que gerações foram levadas a crer que apenas eram mais um na multidão e, em muitos casos, eram mão de obra barata que passava a integrar o grande núcleo familiar. Entendo que as duas situações devem ser consideradas. Na primeira, muitas pessoas não desenvolveram filtros para se expressarem de forma respeitosa, revelando as partes não tão boas de si. Na segunda, um grande grupo de pessoas não consegue se expressar ocultando o que tem de melhor em si. Por isso faço a pergunta: se não sou especial e não sou apenas mais um, quem sou?
Acredito que nem uma nem outra situação seriam modelos a serem seguidos, porque entendo que não somos especiais, assim como não somos apenas mais um. Cada Ser Humano neste planeta é único, singular e múltiplo, não necessariamente especial. Nunca apenas mais um. As gerações anteriores, que foram educadas na base do medo, eram levadas a fazerem o que não queriam em nome de uma pressão social que os oprimia. Não havia horizontes para os submissos dos núcleos familiares e eles ficavam fracos emocionalmente. Não lutavam porque não viam possibilidades. Nas gerações seguintes, para que os filhos não passassem pela mesma situação, muitos pais passaram a criar sem terem a coragem de educar os filhos. Desse modo, muitas crianças cresceram com os excessos da ausência de limites. Os pequenos deuses que foram criados podiam tudo. Igualmente, ficaram fracos emocionalmente. Não lutam, porque não suportam um “não” como resposta. São essas gerações que se encontram nas famílias, nas organizações e na sociedade. Qual o resultado disso? Particularmente acredito que são pessoas únicas e singulares com a sua multiplicidade que vão interagir para daí surgir algo melhor. Apoiando-se na inteligência emocional se poderia dizer que tanto aqueles que se submetem ao não ver possibilidades, como aqueles que não toleram a divergência, necessitam desenvolver o autocontrole. Da interação entre submissos e mimados é que pode surgir pessoas com autocontrole, prudência e humildade suficientes que resultem na fortaleza emocional da temperança. Com isso, as pessoas vão identificar o momento de se expressar ou de não se expressar na constante busca pela realização interdependente com o outro.
Enfim, ouvi muitas pessoas afirmarem com o peito inflado de orgulho que falam tudo o que lhes vem à cabeça, doa a quem doer. Quando ouço isso formo uma imagem não tão positiva. Revela que estou diante de alguém fraco emocionalmente, porque não desenvolveu competências humanas fundamentais para ser um melhor profissional. Frente a uma divergência, grita, ofende e agride. Por outro lado, nunca falar nada para não divergir é igualmente prejudicial, porque gera a sensação de uma falsa harmonia. Ambas as posturas prejudicam o ambiente organizacional, social e familiar. Por isso, do equilíbrio entre os príncipes e as princesas, únicos e não especiais, e dos submissos, que não são apenas mais um, surgirá uma geração emocionalmente inteligente para ser assertiva sem ser arrogante e humilde sem ser submissa. Finalmente, vamos conviver com pessoas que nem sempre falam o que pensam, mas não deixam de falar o que é importante.
Moacir Rauber
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