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E o Brasil, tem jeito?

Cheguei com bastante antecedência no aeroporto de Brasília para o voo que me levaria até Florianópolis. Despachei a mala e segui para o controle da Polícia Federal onde tirei os documentos do bolso, o relógio e o celular. Passei tudo pelo Raio-X, juntamente com a mochila de mão. Logo adiante recolhi tudo e fui para o portão de embarque que era bem distante no aeroporto. Lá chegando, como hábito, bati com a mão no bolso da calça para conferir se a minha carteira estava ali. Ela não estava. O susto que levei foi imediato. Instintivamente passei as mãos pelos bolsos da camisa e do paletó procurando-a. Não encontrei nada. Refiz o movimento. Nem sinal da carteira. A realidade era a de que havia perdido a minha carteira com os documentos pessoais, além do cartão de crédito e de mais ou menos quatrocentos reais. O diálogo mental era o pior possível. Os palavrões não foram verbalizados, mas foram ditos. Passado o impacto inicial comecei a pensar, O que posso fazer? O caminho de volta, óbvio. Retornei ao controle da PF. Não estava. Um oficial de controle foi até o balcão da companhia, mas também não encontrou a minha carteira. O extravio de documentos sempre gera um grande transtorno. Não havia mais nada que eu pudesse fazer, a não ser registrar o ocorrido e tomar providências sobre tudo aquilo que envolve quando se perdem os documentos. Devagar fiz todo o caminho de volta até o portão de embarque. Eu estava aborrecido comigo mesmo. Também lamentava o fato de que no Brasil a devolução daquilo que se perde é algo raro, porque afinal somos o país em que se acredita que aquilo que é achado não é roubado. Na realidade se é achado, e não é seu, é roubado. O ditado representa uma justificativa para aqueles que querem se apropriar daquilo que não lhes pertence. Eu estava desolado. A semana não começaria bem.

Ao retornar para o portão de embarque ouço alguém da companhia me chamar pelo nome. Era um funcionário da empresa de aviação. Como usuário de cadeira de rodas que sou, pensei que se tratava do fato de eu ser prioridade no embarque. Para minha surpresa, ele se aproximou de mim e disse:

– Esta carteira é sua? Alguém a encontrou e me entregou. Conferi o seu nome no sistema e por coincidência você vai voar conosco.

A expressão “o queixo caiu” estava materializada na minha cara, porque a surpresa foi grande. Todos aqueles pensamentos negativos foram substituídos e acompanhados por várias emoções positivas. O azar se transformou em sorte. A tristeza em alegria. A revolta em gratidão. Agora era a hora de agradecer mentalmente aquele sujeito anônimo que devolveu a minha carteira para o colaborador da empresa aérea, a quem agradeci efusivamente. Agora era o momento de comemorar uma excelente semana que terminava e outra melhor ainda que estava para começar. Agora era a hora de pensar que o Brasil tem jeito, porque as pessoas na sua maioria são do bem. Agora é a hora para que as pessoas de bem tomem as rédeas desse país a partir da mudança de conceitos, da cultura e até de simples expressões que balizam comportamentos. Achado não é roubado? Por que não, achado deve ser devolvido? A ocasião faz o ladrão? Por que não, a ocasião mostra o caráter?

E o Brasil tem jeito? O fato aqui contado prova isso. Simbolicamente este episódio ocorreu em Brasília, uma cidade marcada pela corrupção. Porém, com a exposição de comportamentos honestos podemos mostrar a cara de um Brasil em que a grande maioria das pessoas é do bem. Ficou evidente na conduta daquele anônimo e do colaborador da empresa aérea que me devolveram a carteira sem querer nada em troca. Eles fizeram aquilo que o caráter deles determinou. Eles fizeram o que todos devem fazer. Eles fizeram o que é normal fazer. Muito obrigado por serem normais!

Muito obrigado,

Amilton Rodrigues de Oliveira

Colaborador da AVIANCA

Quanto custa a honestidade?

Na última semana presenciei um exemplo de que a honestidade tem um preço a ser pago e pode ser o da liberdade. O exemplo vem do ambiente organizacional em que se criou uma lanchonete dentro da empresa para o consumo responsável por meio da autogestão. O planejamento foi feito. O projeto foi implantado. Um sonho realizado das pessoas e da organização.

A empresa de tecnologia trabalha num ambiente bastante descontraído, sem horários fixos para a equipe de criação e de desenvolvimento. Por isso, muitas vezes essa equipe avançava noite adentro quando começavam num processo de criatividade. Nesses dias não havia hora para acabar. Por isso, a área de gestão de pessoas propôs criar um bar em que se ofereceriam comidas saudáveis, lanches, frutas e refrigerantes para o momento de finalização dos trabalhos. Os produtos estariam disponíveis para serem consumidos por quem quisesse a preço de custo. Cada usuário seria o responsável por passar o cartão para lançar o débito na sua própria folha de pagamento. O primeiro mês foi um sucesso. Tudo certo. O segundo, o terceiro e quarto meses também. Todos felizes e os produtos lançados nas respectivas contas dos usuários. Lá pelo final do primeiro semestre aconteceu uma pequena diferença entre o consumo real e o consumo lançado. Tudo bem, alguém deve ter esquecido, pensou o responsável pelo fechamento das contas da lanchonete. Porém, ao final do primeiro ano o déficit já era algo esperado e se repetia mensalmente em valores cada vez maiores. Quando a experiência atingiu dois anos quase ninguém mais lançava os produtos que consumia. O déficit era gigantesco!

O que aconteceu nesse caso? A liberdade é uma dádiva daqueles que sabem vivê-la com sabedoria e para isso é preciso lembrar que aquilo que se faz AFETA a própria vida, mas também AFETA a vida de outros. Com a consciência do AFETO a liberdade é efetiva! Não foi o caso, A liberdade e a confiança foram dadas, mas o seu uso não produziu o resultado esperado. O que vocês fariam? No exemplo em questão, os mesmos funcionários continuam a trabalhar em horários extraordinários na empresa. Quando o trabalho avança noite adentro, eles continuam a sentir sede e fome. Porém, agora eles compram os mesmos produtos que tinham à disposição internamente pelo dobro ou triplo do preço de empresas externas. O projeto foi encerrado, porque a liberdade sem responsabilidade cobrou o seu preço. É importante entender os benefícios que a liberdade nos proporciona para que se tomem as atitudes e se adotem os comportamentos que ela nos cobra, sob pena de pagar um preço que não gostaríamos: a sua perda. E a perda da liberdade não necessariamente quer dizer estar atrás das grades num presídio, mas estar num ambiente em que se tem a confiança daqueles com quem se convive.

Como vai a sua honestidade? A quem ela AFETA? Ela pode custar a sua liberdade.

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Saindo de fininho

Uma mesa com quatro rapazes. Eles já haviam consumido umas quantas cervejas cada um. Não pagaram. De repente vão se levantando um a um e começam a sair de fininho. O que vai pensar o garçom? Chama os seguranças, fala com o gerente. Chama a polícia! Os caras vão dar o nó! Pensa o garçom desesperado. Não. Nada disso. Na verdade todos eles eram fumantes e somente saíram para fumar o seu cigarrinho. Dali a pouco voltaram e pediram mais uma rodada.

Ah, como seria bom se sempre fosse assim…
Fonte: http://www.midiaindependente.org/pt/red/2009/09/453635.shtml

Um atestado, os cúmplices e os ladrões de si mesmos

Estava na rua numa véspera de feriado. Muitas outras pessoas também estavam. Enquanto eu esperava na faixa de pedestre para cruzar a rua, uma mulher que aparentava ter por volta de 35 anos se parou ao meu lado.  Ela falava ao celular:
– Não, não. Não fui trabalhar hoje. Pedi um atestado. Estou na rua para fazer umas compras…

O diálogo representa uma situação corriqueira que se repete diariamente na realidade das empresas públicas e privadas do Brasil. Nós sabemos disso, é senso comum. Ouvi sem querer, mas pensei deliberadamente sobre o que estava acontecendo ao meu lado. Poderia identificar uma rede de roubos que prejudicava outras pessoas, provavelmente, uma equipe e uma organização. Como assim? É apenas um dia de serviço que ela faltou ao trabalho…

Na verdade, nesse fato se pode identificar um duplo roubo, além de outros cúmplices. Ela rouba a sua organização, ela tem cúmplices no seu roubo e rouba a si mesma. No primeiro caso, o roubo é facilmente identificável. A pessoa foi contratada para estar na organização naquele momento e não para fazer compras. Naquele horário ela tinha o compromisso moral e legal de estar na organização, que, para isso, pagava-lhe o salário no fim do mês. Não sei se a organização dela era pública ou privada, o que sei é que ela havia pegado um atestado falso para estar na rua. Ela não estava roubando algo físico, mas ela roubava a produtividade e a competitividade da sua equipe e da sua organização que contava com ela para entregar aquilo que se propunha para os seus clientes. Aquele dia poderia representar o atraso na entrega de um projeto, o não atendimento de um cliente ou a diminuição da produção da sua equipe. E isso é roubo.

Os cúmplices são aqueles que emitem um documento falso para que uma pessoa continue a receber integralmente por aquilo que não cumpriu. A funcionária que faltou ao trabalho deliberadamente não merecia a totalidade do seu salário e isso somente foi possível porque alguém fraudou um documento que lhe permitiu não ser responsabilizada pela sua falta de responsabilidade. Em outras palavras, isso é roubo.

E por que ela estaria roubando a si mesma? No meu ponto de vista, esse roubo acontece antes mesmo de ela roubar a organização e de arregimentar cúmplices. Além disso, é muito mais grave. A partir do momento em que ela assumiu o compromisso com a organização e não o cumpriu, ela roubou de si mesma a integridade, a honestidade e também a sua credibilidade. Não é íntegro usar de subterfúgios para deixar de cumprir com compromissos assumidos. Não é honesto prejudicar uma organização e uma equipe ao receber uma remuneração indevida. E, por fim, ela roubou a sua credibilidade ao adotar o comportamento que adotou. Com que credibilidade essa pessoa poderá exigir de seus filhos, dos vizinhos ou mesmo dos políticos um comportamento íntegro e honesto?

Com toda a certeza o roubo que ela cometeu ao faltar ao trabalho sem uma razão verdadeira era uma consequência de já ter se roubado a honradez e a dignidade. Roubar de si mesmo é o precursor dos demais crimes. Cabe a ela e àqueles que roubam das organizações e de si mesmos lembrar que ser dispensável temporariamente em função de um atestado falso, muito provavelmente indica alguém que poder ser dispensável permanentemente. Prenda o ladrão de si mesmo para também não roubar dos outros.


E nós que sabemos que o fato acima é algo comum no país somos cúmplices por omissão…