O preço do orgulho
A vida era dura e as coisas não aconteciam com facilidade para ela. Cada sonho, toda busca ou qualquer conquista exigia um grande esforço. No entanto, ela se orgulhava de lutar pelo que queria com autonomia. O tempo passava rápido e ela não havia conseguido realizar uma de suas grandes ambições: a faculdade. Para conseguir ingressar numa universidade pública o conhecimento adquirido no Ensino Médio já estava muito distante. Dinheiro para fazer um cursinho nem pensar. Entrar numa universidade privada era uma possibilidade, porém a parte financeira era um empecilho. Ela vivia sozinha com a sua filha e o salário que recebia apenas cobria as necessidades básicas das duas. No seu trabalho, ela era dedicada, além de se envolver em atividades de voluntariado. Ela se orgulhava de poder ajudar. Um dia, conversando com a sua chefe, comentou sobre o sonho não realizado. A chefe disse que pagaria a universidade. Rapidamente ela recusou, dizendo que não era necessário, ao que a chefe respondeu:
– Não saber receber ajuda é uma das manifestações do orgulho…
Uma constatação verdadeira, porque o orgulho não somente se manifesta pela arrogância na interação com os demais. Ele está presente no excesso de autonomia e de independência que nos impedem de receber ajuda, um gesto de soberba ao crer que não se necessita dos outros. O provérbio português, “ninguém é tão pobre que não possa dar, nem tão rico que não precise receber”, retrata bem a interdependência humana. Todos podem dar algo. E ela entregava as suas competências no trabalho ao estar disponível para as atividades que eram parte de sua função. O ambiente que ela criava era positivo e propositivo. Ela ainda fazia os trabalhos voluntários ao ajudar a cuidar de idosos num lar próximo da sua casa. Não era porque a sua condição financeira não fosse das mais favoráveis que ela não poderia contribuir com algo além do seu trabalho. E ela o fazia acompanhada de sua filha. Porém, ao não querer ajuda, o orgulho se manifestava pela altivez ligada a soberba de se crer autônoma num mundo interdependente. Por que ela não queria que alguém lhe pagasse um curso universitário? Não saber receber ajuda pode ser soberba, orgulho ou arrogância e não sempre um exemplo de determinação pela autonomia. Dessa forma, muitos acreditam que se o orgulho de lutar pela autonomia pode representar a soberba, a virtude deve estar em seu antônimo, o outro extremo. Porém, o antônimo pode ser a submissão, o servilismo e até o puxa-saquismo, comportamentos que tampouco são positivos. Volta-se para o caminho do meio. Entre os extremos de orgulho e de submissão está a humildade, que é a virtude de saber se autoavaliar para reconhecer as fortalezas e as limitações, agindo em conformidade com elas. É a humildade no comportamento que permite que se interaja com os outros sem querer sobrepor-se ou se mostrar superior a eles. Enfim, creio que a virtude está no equilíbrio entre ser assertivo sem ser arrogante e ser humilde sem ser submisso. Assim, chega-se à harmonia.
Depois da conversa com a sua chefe, ela travou uma luta interna porque não havia gostado de ouvir que poderia estar sendo orgulhosa, arrogante e soberba ao não querer receber ajuda. Ela sempre lutara para manter a sua dignidade e se orgulhava disso. Entretanto, após os diálogos internos profundos ela conseguiu ver que a chefe tinha razão. Ela estava disposta a abrir-se para receber ajuda, porque o preço do orgulho, da soberba e da arrogância seria a não realização do sonho de fazer uma faculdade. Foi assim que ela se formou aos quarenta anos de idade.
Moacir Rauber
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