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FUMAR UM BASEADO QUALQUER UM SABE…

O Domesticador de Desejos: fumar um baseado qualquer um sabe…

Naquela sexta-feira à noite as horas demoravam a passar, porque havia sido uma semana cheia para os alunos. Alguns estavam despertos e participativos, enquanto outros estavam com cara de cansados e com vontade de voltar para casa ou mesmo sair para as festas. Afinal, eram jovens que trabalhavam de dia e faziam faculdade à noite. Era o preço a ser pago para poder fazer melhores escolhas num futuro não tão distante. Num momento descontraído, um dos alunos disse:

– Professor, estou com vontade de sair, tomar uma cerveja e fumar um baseado para relaxar.

Os demais se entreolharam entre sorrisos e cochichos, assim como eu. Após um pouco de silêncio, perguntei:

– Quanto esforço você precisa para fumar um baseado? O que você precisa aprender para tomar cerveja?

Os sorrisos deram lugar a expressões reflexivas.

Já diz o ditado popular, “Vontade é coisa que dá e passa…”, por isso, é preciso educar a vontade. Desse modo, entender a riqueza por trás desse adágio é apropriar-se das escolhas feitas sem se deixar levar pelas facilidades daquilo que, aparentemente, estamos perdendo. O que eu quero? Essa pergunta nos põe de volta aos ideais mais elevados em que temos claro aquilo que buscamos fazer com as chances que a vida nos dá. O que o levou a estar num banco de universidade numa sexta-feira à noite?

Trazer à memória as razões das escolhas feitas nos reconecta com os ideais, assim como nos exige educar a vontade e desenvolver bons hábitos. Muitos dos nossos impulsos baseados nas emoções, quando seguidos, nos levam para onde não queremos ir. Portanto, ao educar a vontade, tendo em mente os nossos ideais mais profundos, nós conseguimos diminuir os efeitos perniciosos de hábitos, como a procrastinação; podemos manter a rota ao controlar a busca por prazer imediato. Ao nos perguntar o que queremos, passamos a escutar as vozes que ecoam no mais profundo de nosso ser, aproximando-nos de nossos valores e objetivos.

Portanto, ao escutar a fala do aluno “quero sair, tomar uma cerveja e fumar um baseado”, pude escutar a vontade que o levaria ao prazer imediato, porém o afastaria de sua busca maior. Ao se expressar ele revelou um pensamento baseado num estímulo externo, dando-lhe a possibilidade de fazer uma escolha que o aliviaria rapidamente de um esforço que exigia a sua dedicação. O esforço de estar em sala de aula num sexta-feira à noite demandava o domínio da vontade. Quantas vezes nos defrontamos com situações assim? Quantas vezes sucumbimos?

Por isso, o silêncio logo após a expressão do aluno seguido da pergunta, “quanto esforço você precisa para fazer isso?” cumpriu um papel importante no despertar daquele aluno. A pergunta, caso respondida, revela que não há mérito no caminho fácil, porque seguir o impulso vindo das emoções qualquer um pode, inclusive um tolo.

Por outro lado, estudar num horário em que muitas pessoas estão buscando o prazer imediato exige autodomínio, visão de longo prazo e conexão com propósito. Manter a escolha de estar em sala de aula na sexta-feira requer o domínio de si mesmo. Requer domesticar os nossos bichos interiores.

O aluno que fez o comentário na aula há quase dez anos, escreveu-me na semana passada dizendo que aquela pergunta mudou a sua forma de ver o mundo. Ele me disse:

– Professor, eu não saí de sala de aula naquela noite e em nenhuma sexta-feira até o final da faculdade. Eu sabia o que queria…

Fiquei feliz com a escolha feita por ele, porque entendeu que o prazer imediato está ao alcance de qualquer um, enquanto os compromissos com as escolhas conscientes requerem esforço, dedicação e persistência. Quanta competência é necessária para fumar um baseado? Quanto esforço é preciso para sair da sala de aula para encher a cara? Pouco ou nenhum, porque basta ser estúpido o suficiente para se acreditar mais esperto que os outros.

Finalmente, é essencial que cada um tenha claro o preço a ser pago pelas escolhas, assim como o horizonte que se abre ao assumir e cumprir com os compromissos.

“Nascemos originais e morremos fotocopias” (Carlos Acutis).

Moacir Rauber

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