Gratuidade e Responsabilidade
Ao atingir a meta estabelecida para o ano de trabalho remunerado, busco oferecer uma ou duas oficinas gratuitas. Para manter a qualidade, as vagas são limitadas e respeitam a ordem de inscrição. Assim fiz no último mês. As vagas foram abertas e em pouco tempo foram preenchidas. Recebi pedidos de informações sobre novas oportunidades, respondendo que somente seriam ofertadas no próximo ano. Frustração para aqueles que não conseguiram mais vaga. Para mim, a alegria de poder compartilhar conteúdos e experiências para transformar e ser transformado pelo mundo ao qual pertencemos. Comecei a preparação do conteúdo dedicando horas de pesquisa e elaboração de novas atividades com uma sequência de reuniões de trabalho com a minha colega facilitadora da oficina. Duas pessoas comprometidas em entregar o melhor. A minha expectativa aumentava com a proximidade da data de início da oficina. Enviamos mensagens com material preparatório. Finalmente chegou o dia e abrimos a sala virtual trinta minutos antes do horário marcado para receber os participantes. A expectativa nos gerava a alegria. O horário de início chegou e nenhuma das pessoas que se haviam inscrito compareu. Em mim, sentimento de frustração. Cinco minutos depois do horário marcado entrou a primeira pessoa e começamos a oficina com trinta minutos de atraso contando com a presença de apenas vinte por cento dos inscritos. Pergunto: quanto vale um evento gratuito? Qual é a responsabilidade daquele que se dispõe a receber?
Para a pergunta quanto vale um evento gratuito se deve considerar que não há nada que seja gratuito. Ainda que não se pague por algo que se está usufruindo, alguém está pagando. Esse pagar pode ser em dinheiro, recursos, tempo ou outra forma de comprometimento com aquilo que é oferecido de graça. A oficina não teria cobrança aos participantes, contudo, houve o custo de tempo para a preparação e os recursos tecnológicos usados pelos facilitadores. Além disso, ao oferecer a oficina quem a ministra deixa de usufruir de outras possibilidades para estar onde se comprometeu estar. Portanto, posso não pagar pelo almoço, porém alguém o paga.
Não havendo nada que seja gratuito, isso nos leva para a questão da responsabilidade de quem se dispõe a receber. Aqueles que se inscreveram ocuparam as vagas e impediram que outros se inscrevessem. Ao não participarem efetivamente da oficina, privaram a outras pessoas de receber gratuitamente algo a que eles se candidataram. Eis a responsabilidade com aquilo que é “gratuito”. Escolher não receber o que é disponibilizado gratuitamente não é problema, entretanto, quando a minha escolha priva o outro temos um problema.
Tomemos como exemplo o sistema de saúde brasileiro, gratuito. Muitas pessoas tem seus horários agendados com médicos ou laboratórios e não comparecem. Deixaram de receber um benefício por sua escolha, porém roubaram de outra pessoa a possibilidade de fazer uma consulta ou os exames que seriam importantes. Qual é a tua responsabilidade sobre aquilo que você não paga? Quem está pagando? Creio ser importante responder.
Voltando à oficina, confesso que a minha frustração inicial se havia alimentado da expectativa pela presença das pessoas que se inscreveram que não se concretizou. Em seguida, ao me desvincular da expectativa a frustração se transformou em entrega, porque o meu compromisso era com a minha presença e com a presença daqueles que escolheram estar. A ausência dos inscritos era de sua responsabilidade.
Enfim, naquele dia começamos a oficina na qual, inicialmente, sentia o gosto amargo da frustração pela não presença de muitos que não compareceram, porém terminamos a noite com o sabor da satisfação presente no sorriso e no reconhecimento daqueles que estavam presentes. Por isso, o exercício de resgatar a frustração pela expectativa não cumprida com o foco na responsabilidade do compromisso nos traz satisfação. O compromisso está no nosso controle e ele sempre é remunerado.
Moacir Rauber
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