A equipe de basquete em cadeira de rodas, normalmente, é uma atração por onde passa. Não foi diferente desta vez. Duas vans estacionaram nas vagas para pessoas com deficiência daquele centro comercial e logo começou a movimentação. Desce uma pessoa com muletas. Mais uma. Outra. Os transeuntes diminuem o ritmo e a passada para poderem observar, ainda que meio de lado, disfarçando… Depois o elevador começa a baixar um usuário de cadeira de rodas, dois, três e assim vai até que os doze atletas, todos com alguma deficiência, haviam desembarcados. Alguns já haviam cruzado a faixa de pedestres e outros ainda não. Eu estava de um lado da rua e conversava com alguém do outro lado. Nisso, uma senhora muito elegante conduzindo uma BMW para um pouco antes da faixa de pedestres. Ela dá uma olhada geral para o grupo de atletas e aponta para a minha cadeira, já que era aquele que estava mais próximo, para em seguida dizer:
– Eu sei como é usar uma cadeira de rodas. Usei uma por quase três meses…
Disse-o com certa dose de orgulho para talvez se identificar com o nosso problema e com a nossa tragédia. Sei que muitas vezes as pessoas fazem esse tipo de comentário para tentar uma aproximação e estabelecer contato em condições de igualdade, o que revelar uma diminuição da discriminação e do preconceito. Entretanto, falar que sabe como o outro se sente com relação ao uso de uma cadeira de rodas é de uma ignorância sem fim, porque isso só quem está na situação sabe. Provavelmente aquela senhora usou a cadeira de rodas no período em havia torcido ou quebrado um pé ou mesmo uma perna, o que é muito diferente de estar numa cadeira de rodas por tempo indeterminado e de maneira irreversível. Eu sei o que é estar numa cadeira de rodas por uma lesão medular e o que isso representa para mim, mas eu não sei o que isso representa para o outro que está numa condição similar a minha. Não sei e não há como saber o que significa para o outro, porque simplesmente eu não sou o outro. Isso depende de cada um, da sua condição psicológica, emocional e social. Cada um com os seus problemas e com a sua interpretação deles. E para nós, atletas que ali estávamos, há tempos que o uso da cadeira de rodas já havia deixado de ser uma tragédia. E mais… O uso da cadeira de rodas é a nossa solução.
Olhei para os meus colegas e todos ficaram assim meio sem graça. Com certo ar de deboche respondi:
– Que maravilha! Eu uso uma há 360 meses…
Ela deu um sorriso meio amarelo e foi-se embora.