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QUEM É VOCÊ NO QUARTO DOS ESPELHOS?

Imagem: IA COPILOT

QUEM É VOCÊ NO QUARTO DOS ESPELHOS?

Oito dias… era o tempo que minha esposa e eu nos propusemos a estar no retiro de silêncio. Ao lembrar que tudo seria calmo, senti-me um pouco incômodo, mas, mesmo assim, não levaria o celular… Ao chegar na casa de retiros vimos uma araucária gigante em frente da entrada principal e à direita, um espaço arborizado, com parte ajardinada e vegetação nativa. Um lugar lindo e bem cuidado em todos os detalhes, próprio para a tranquilidade. Fomos recebidos pela Irmã Mari que nos conduziu cada um para o seu quarto. Em seguida haveria uma missa na capela e o silêncio seria a regra. Assim foi. Depois da missa o jantar em silêncio e, logo, cada um para o seu quarto e sem televisão. Ainda bem que trouxe o celular, pensei ao haver sucumbido e minha intenção inicial de não trazê-lo. Acessei minhas mensagens e dormi cedo. Durante a noite, derrubei o celular que se partiu ao cair. Agora sim o silêncio havia chegado!

Na manhã seguinte, irritado por haver perdido a muleta que é o celular, fui à Capela, ao café da manhã e me dirigi para a sala onde teríamos as reflexões que orientariam o retiro. A mente, que muitas vezes nos mente, dizia-me, Onde é que você se meteu….  Todos reunidos e tudo esclarecido sobre o retiro. Na sequência o padre fez uma oração e apresentou a analogia que usaria para “caminhar pelos dias do retiro”: uma casa de quatro ambientes (Analogia do Pe. Eliomar Ribeiro). O primeiro dos ambientes era o quarto dos espelhos em que deveríamos entrar. A descrição nos levava para um espaço em que há espelhos por todos os lados. Para qualquer lugar que se olha somente se vê a si mesmo. Ainda que eu não estivesse tão entusiasmado, as frases reflexivas começavam a me desviar da irritação externa, ela se voltava para dentro. A proposta do retiro não tinha nada a ver com o outro, mas comigo. Tratava-se de um momento para orientar ou a reorientar a própria vida. A mente fustigava, Aos sessenta anos pensar nisso… Olhava à minha volta e via os demais, alguns poucos mais jovens, outros tantos com seus setenta ou oitenta anos fazendo o retiro, respondendo as perguntas e “visitando o mesmo quarto”. Como quase todos eram de vida consagrada, era um exercício que faziam todos os anos. Logicamente que cada um se via no quarto dos espelhos. O que será que cada um enxergava no seu quarto? Já não me parecia que estava num ambiente de silêncio. Havia muito ruído dentro de mim.

No quarto dos espelhos via o meu passado com todas as escolhas feitas que me trouxeram até aqui, assim como me lembrava das pessoas com quem compartilhava a vida. Às vezes, ao olhar de um ângulo diferente não me reconhecia, porque se sobressaíam os pés ou o alto da cabeça. Terminava a primeira reflexão com o humor alterado. Por um lado, a impaciência de quem não tem acesso ao objeto do vício, o celular, e, por outro, a euforia de começar a navegar numa aventura interna profunda. O que mais refletiria o quarto dos espelhos?

A aventura seria guiada por textos e perguntas que nos acompanhariam durante o dia: (1) quais as dimensões de sua vida precisam se expandir? Os textos nos orientavam para pensar no corpo, na vontade, no coração e na razão. (2) A sua vida necessita de um salto de qualidade? A questão nos confronta com o tempo dedicado de modo a que se ofereça algo ao outro sem se esquecer de si mesmo na oração. Por fim, uma pergunta a queima roupa: (3) na sua vida existe o risco da aventura ou somente o medo asfixiante? (Textos bíblicos e exercícios propostos há 500 anos por Santo Inácio de Loyola)

Com essas perguntas em mente, o retiro não era de silêncio. Os espelhos refletem a imagem, mas o silêncio ecoava os meus ruídos.

E você, se animaria a entrar no quarto dos espelhos?

“É na fraqueza que se revela totalmente a minha força” (2Cor, 12, 9)

Moacir Rauber

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