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O Beijo da Morte é …

O beijo da morte é…

… o sopro da Vida.

Moacir Rauber

Naquele dia recebi uma notícia que não queria.

Foi difícil saber que alguém próximo partiria.

Era a morte que no meu círculo entrava.

Como consolo o seu sorriso a mim chegava.

Pareceu-me um sorriso franco, o beijo foi ardente.

Fiquei feliz! Era um beijo quente, parecia um beijo de gente.

“A morte faz parte da vida, é um novo ciclo que começa…,

Estou namorando a vida”,

Era o que eu pensava.

Acreditei na sua presença.

Não sabia quem eu beijava.

Enterrei sonhos, um a um, ano após ano.

Não percebia o tamanho do engano.

Quando eu ficava triste você me dizia:

“Fica tranquilo, tudo vai dar certo…” e sorria.

O seu sorriso cada vez mais autêntico me parecia.  

Ficava bem tranquilo quando você concluía:

“Confia em mim! Por você eu mataria.”

Assim,

Eu abdiquei.

Eu confiei.

Eu acreditei.

Em você investi.

Para mim, você era a vida.

A eternidade você prometia.

Mais uma vez você sorriu.

Outra vez me abraçou.

Depois disso você me deixou.

Senti que você me traiu.

Estranho.

Agora sei que você não me deixou.

Compreendo que você não me traiu.

Entendo que você sugou e extraiu.

Percebo que você arrancou e exauriu.

Constato que você dissecou e espoliou.

Concluo que a sua natureza você seguiu.

Os sorrisos eram uma armadilha.

Os abraços eram um engodo.

A vida eterna era a promessa.

Era uma verdade mentirosa.

Verdade? Mentira? Vida? Morte?

A vida sem a morte não existe.

A morte sem a vida não existe.

Morte eterna? É mentira ou é verdade?

Vida eterna? É verdade ou é mentira?

Aquilo que é eterno não morre.

Aquilo que é eterno não vive.

Aquilo que vive não é eterno, MORRE.

Aquilo que morre não é eterno, VIVE.

Eu conheci você.

Você sorriu.

Você me abraçou.

Você me beijou.

Você não é a vida.

Você dá sentido à vida: a morte.

Você a sua natureza seguiu.

Você matou.

Eu renasci.

AGORA entendi.

O beijo da morte é …

O sopro da Vida.

A menina que roubava livros

A narração deste livro expressa uma sensibilidade que não poderia ser humana, ela é feita toda pela “Morte”. Apesar da afirmação “Eis um pequeno fato, você vai morrer”, ela nos conta a trajetória da menina que roubava livros com uma simplicidade e suavidade capaz de esmiuçar os diferentes sentimentos humanos, sejam eles bons ou maus. A Morte conta que havia mantido contato direto com a menina Liesel, principal personagem do livro, em três ocasiões: na morte de seu irmão menor, quando estava para ser adotada; na morte de um piloto aéreo das forças inimigas, na presença de seu melhor amigo, Rudy; e na morte de seus pais, quando a rua em que morava fora completamente destruída pelos bombardeios da guerra. A história se desenrola na Alemanha, no período nazista.

No início a Morte descreve com uma singeleza que beira a candura o seu trabalho, ao relatar como levou a alma do irmão de Liesel, quando eles estavam sendo levados para a adoção, dizendo que ao descer do trem “havia uma alminha em meus braços”. Em várias passagens a Morte expressa sua incompreensão referente às diferentes atitudes humanas, indo de um extremo ao outro. Neste momento a Morte também admitiu ter cometido o erro de se distrair, deixando-se levar pela curiosidade da história da Roubadora de Livros. O primeiro livro, O Manual do Coveiro, ela roubara sem querer no enterro de seu irmão, aos nove anos de idade. O auxiliar de serviços funerários o deixou cair próximo ao túmulo e ela o ajuntou instintivamente, levando-o consigo. Passado o episódio da morte do irmão Liesel chega a sua nova casa, conhece seus pais adotivos, Hans e Rosa Hubermann. A mãe é muito mal educada, usando sempre palavrões, mas em compensação o pai é muito dedicado e amoroso. Começa-lhe a ensinar a ler melhor, usando o livro que ela trouxera consigo. Nas noites em que ela acordava em meio aos pesadelos com seu irmão, o pai lia e tocava acordeão, contando-lhe histórias até a madrugada. Esses eram os momentos mais felizes de Liesel, que com o passar do tempo percebeu o quanto a mãe Rosa também lhe amava, apesar da rudeza das palavras. Neste meio tempo a guerra começa e a situação econômica se complica. O pai de Liesel não se havia filiado ao partido nazista, sendo-lhe mais difícil arrumar trabalho. Liezel ajuda a sua mãe de criação ao buscar e levar as roupas que ela lavava para as famílias mais abastadas, normalmente em companhia de seu amigo e não assumido amor Rudy. No mesmo período, Liesel também teve que guardar um segredo. O seu pai escondia no porão um judeu, Max, filho de um amigo que o salvara na primeira guerra. Com Max Liesel desenvolve uma relação de amizade muito forte, mas depois de um longo período ele teve que sair do seu esconderijo, porque os nazistas fariam uma vistoria nas casas. Reencontrou Max no final da guerra. O segundo livro Liesel o roubou numa fogueira na qual queimaram livros e artigos considerados contra o sistema. A guerra avançando e os clientes de Rosa começaram a dispensar-lhe o serviço. Um dia a mulher do prefeito, Ilsa, também lhe dispensou os serviços, dando um livro de presente para Liesel. Inicialmente ela o aceitou, mas depois o devolveu dizendo que não precisava de suas esmolas. Alguns dias depois retornou acompanhada de Rudy, entrou furtivamente pela janela e o roubou. Assim, sempre que ela se sentia angustiada com as situações difíceis do dia a dia ela voltava a biblioteca e levava outro livro, embora a Sra. Ilsa sempre soubesse. Os ataques da guerra começaram também a atingir a Rua Himmel, onde Liesel e Rudy moravam. Sempre que eram alertados todos os moradores se dirigiam a um abrigo subterrâneo, onde o medo tomava conta de crianças e adultos. Liesel começou a ler em voz alta para todos, perpetrando nela a paixão pelos livros e pelas palavras. Foi exatamente isso que lhe salvou a vida. Numa noite em que houve um ataque sem aviso prévio a rua foi completamente destruída. Seus pais, seus vizinhos e seu amado, mas nunca confessado Rudy, morreram dormindo, enquanto ela estava escrevendo no porão esta história. Quando os bombeiros chegaram encontraram uma menina de quatorze anos viva entre os escombros. A Morte que recolhia as almas por ali ficou surpresa. Ela viu a menina agarrada ao seu livro, que caiu de suas mãos ao perceber que todas as pessoas que amava estavam mortas. A Morte sorrateiramente agarrou aquele exemplar, pois havia se distraído mais uma vez. Este livro a Morte o mostrou a Liesel, muito anos mais tarde quando a foi buscar junto a seu marido, seus filhos e netos em Sidney, na Austrália. Liesel ficou surpresa ao ver seu livro tantos anos depois e enquanto acompanhava a Morte tranquilamente, ouviu ainda o seu comentário, “Os seres humanos me assombram”.

Um livro com uma linguagem simples e acessível, com um enredo ágil, fácil e envolvente, abordando a natureza humana com uma ingenuidade somente possível pela Morte.

Autor: Markus Zusak
Editora: Intrínseca
Páginas: 494
Ano: 2007
ISBN: 9788598078175