Tenho que fazer…
O que nos revelam as pessoas que sempre nos dizem que “têm que fazer isso ou aquilo”? Serão elas desorganizadas, incompetentes ou carentes?
No intervalo do evento fui tomar o cafezinho e escutei uma conversa paralela:
– Nem te falo, o dia de hoje ainda me mata. Ainda tenho que fazer um relatório hoje, depois tenho que atender dois clientes e no final do dia ainda tenho que buscar as crianças… e blá blá blá.
Registrei o diálogo. No início até me senti um pouco consternado e solidário pela dura rotina de trabalho daquela pessoa e que pode expressar a realidade de muitos ao redor do mundo. Em seguida comecei a pensar sobre o que levaria alguém a criar uma agenda com tantos compromissos que a poderia matar? Além disso, ao escutá-lo tive a impressão de que ele se orgulhava da sobrecarga de sua agenda, por isso me fiz duas perguntas: (1) manter uma agenda com mais compromissos do que é saudável cumprir poderia revelar falta de organização e a incompetência? E (2) relatar o excesso de compromissos com orgulho revelaria uma necessidade de atenção e de reconhecimento? Acredito que situações semelhantes possam trazer elementos que respondam as duas perguntas.
Para mim, chega a ser inquietante responder: (1) manter uma agenda com mais compromissos do que é saudável cumprir poderia revelar falta de organização e a incompetência? Do meu ponto de vista sim, porque tenho desconfianças com relação a alguém que tem dificuldades de gerir seu próprio dia, porque me parece que será difícil que ela exiba as demais competências relevantes para ser competente em outras áreas. Entenda-se organização como o processo de observar e entender determinados cenários para assumir responsabilidades que sejam factíveis. Com essa capacidade é que se cria uma agenda de responsabilidades e de compromissos compatíveis com as próprias competências, respeitando as limitações de tempo e espaço existentes na busca pelos resultados a que se propõe. Da mesma forma, é por meio da organização que se consegue identificar o que é importante aprender e o que é necessário desaprender para desenvolver as competências que o levem para onde se quer ir. Portanto, a capacidade de criar realidades imaginadas do ser humano permite que se simulem e antecipem situações, exercendo a organização um papel importante para que a realidade imaginada se aproxime da realidade concreta. Por isso, é essencial que alguém seja organizado para ser competente.
E a segunda questão é igualmente inquietante: (2) relatar os compromissos com orgulho revelaria uma necessidade de atenção e de reconhecimento? Lembro-me de um diretor que conheci há mais de 30 anos que dizia, “Se alguém me diz que está se matando de trabalhar acredito que a pessoa seja incompetente ou precisa de um abraço”. Particularmente, concordo com ele. Ninguém “tem que fazer” nada. Nós escolhemos fazer e poderíamos verbalizar isso de maneira diferente: ao invés de dizer “eu tenho que fazer…” pode-se dizer, “eu escolho fazer o relatório”, “eu quero atender os meus clientes” e “estou feliz em buscar os meus filhos”. Muda-se a perspectiva e se assumem as responsabilidades sobre a própria vida, inclusive a de transformar um dia pesado e desgastante num dia produtivo e energizante.
E você, tem muito o que fazer ou precisa de um abraço?
Moacir Rauber
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