
Gastar dinheiro qualquer tolo sabe…
Há alguns anos, quando surgiram as máquinas de café em cápsulas, visitei um amigo que havia comprado a maravilha do momento. Mostrou-me como funcionava e a sua praticidade, em seguida, ofereceu-me um café expresso feito na hora. Uma maravilha. Algum tempo depois, esse mesmo amigo me visitou e fomos até a cozinha onde preparei um café. Ao ver que não tinha a máquina de cápsulas, ele disse:
– Que mão de vaca, ainda não comprou uma máquina?
– Não, respondi. Gosto muito dessa cafeteirinha…
O consumo é o motor da economia que reverte em bem estar social e renda, uma vez que produz riqueza e cria empregos. Igualmente gera arrecadação de impostos que retorna em serviços para a própria sociedade. É um modelo que deveria funcionar bem, desde que fôssemos conscientes de nossas responsabilidades referentes a capacidade produtiva e, consequentemente, do consumo derivado dela. A realidade, entretanto, é diferente. Por um lado, o mercado desenvolve e vende produtos que atendem as necessidades das pessoas. Por outro lado, o mesmo mercado inventa, cria, desenvolve e vende produtos sem que isso atenda a uma necessidade, são as modas. Trata-se de uma armadilha em que muitas pessoas caem ao gastar mais dinheiro do que a sua capacidade produtiva, ao ver no modismo uma necessidade. Assim, terminam por comprar o que não necessitam com dinheiro que não tem para atender necessidades que não existem.
A necessidade existente ao consumir café, como a conexão, o bem estar ou o ritual que traz ordem e paz, era e ainda é atendida pela cafeteira de pressão estilo italiana. Esta, foi patenteada em 1933 com sua simplicidade e capacidade de produzir um bom café. Logicamente, o meu amigo não se deu por vencido e argumentou sobre a maravilha da cafeteira em cápsulas, com as quais eu concordo. De todas as formas, cada um com as suas escolhas.
Na minha forma de ver o mundo, procuro comprar o que necessito com o dinheiro que tenho. Não se trata de ser mão de vaca ou tacanho, contudo, comprar algo que exija que ganhe mais dinheiro para sustentar uma necessidade que não tenho não me parece tão inteligente. Nesse ponto voltamos ao mercado, pois ele tem a capacidade de transformar comportamentos e desejos em moda que se consome.
Portanto, a necessidade atendida ao se consumir um bom café é transformada em desejo de comprar uma máquina de cápsulas. É importante ter claro de que a máquina é apenas uma estratégia de atender uma necessidade, como pode ser o uso de uma cafeteira comum. Comprar a máquina é uma escolha individual. Num movimento semelhante, o mercado inventou, criou, desenvolveu e nos vende produtos, como anabolizantes, cigarros eletrônicos ou unhas postiças para atender uma suposta necessidade. Pergunto: qual seria a necessidade atendida pelos produtos mencionados? Provavelmente, as necessidades atendidas poderiam ser de apreciação, aceitação, valor próprio ou auto estima. Contudo, seriam essas as estratégias mais apropriadas para atender tais necessidades? A resposta é de cada um.
Por fim, o mercado continua a nos vender produtos e serviços para atender determinadas necessidades e para isso segue inventando, criando e desenvolvendo novidades. Assim, de tempos em tempos aparecem as novas “necessidades” que nos enlouquecem como um “morango do amor”, uma ayerfreyer ou outro produto qualquer que parece impossível que não o compremos. Frente a isso, o que fazer? Creio ser importante responder: qual é o preço que te cobra o produto ou o serviço comprado? Ter em mente a necessidade a ser atendida, lembrando da relação custo benefício daquilo que se compra e quanto do teu tempo de trabalho ele vai consumir. São questões a serem consideradas antes de comprar aquilo que você quer.
Na semana passada visitei o meu amigo que me ofereceu um café. Vi que ele o preparou com filtro, pó e água quente. Perguntei: e a máquina de cápsulas? Ele respondeu: ahh, descartei, ela dava muitos problemas…
Lembre-se, gastar dinheiro qualquer um sabe, inclusive um tolo. Por isso, domesticar a vontade para resistir aos desejos está na base de fazer feliz uma jornada.
“Nascemos originais e morremos fotocopias” (Carlos Acutis).