Falsidade Autêntica: é possível?
Por onde ele passava os cumprimentos eram efusivos, os elogios eram distribuídos a torto e a direito e o sorriso estava sempre presente. Ele era o rei da simpatia. Não esquecia as datas importantes de ninguém. No aniversário mandava um presente. No Natal, Ano Novo e Páscoa sempre enviava uma mensagem. A rede de relacionamentos dele era muito bem administrada. De tão atencioso que era, dava-nos a impressão de que não podia ser verdadeiro. Enfim, o que será que era autêntico por trás do comportamento do “Senhor Simpatia”?
Festa de final de ano. Todos reunidos. Chega um e outro. Os abraços, cumprimentos e sorrisos do “Senhor Simpatia” seguem cumprindo o seu papel, quase sempre acompanhados de um elogio:
– Caramba, a melhor caipirinha do mundo é você quem faz! Diz o “Senhor Simpatia” para um conhecido seu.
Nesse momento, outro presente que ainda não havia sido percebido pelo “Senhor Simpatia” se manifestou, “Ei, você sempre falou que a minha era a melhor do mundo…”. Um leve constrangimento. O “Senhor Simpatia” puxou o recém visto para o lado, deu-lhe um aperto de mão mais caloroso, fez-lhe um afago e cochichou-lhe ao ouvido, “Falei isso para ele apenas para agradá-lo. A tua é a melhor!” E ele seguiu para abraçar uma amiga que chegava.
É muito bom ser recebido com um sorriso, um aperto de mão ou um abraço ou ainda todos eles juntos. É muito bom receber um telefonema, uma mensagem ou um presente em datas especiais. Embora, tão importante quanto recebê-los é que eles sejam autênticos. Ao observar e refletir sobre o comportamento do “Senhor Simpatia”, imaginei que se ele fala isso para um também poderia falar para o outro. Com um é a melhor caipirinha, com outro é o abraço mais caloroso, com mais outro é o sorriso mais lindo e assim pode ser com relação a qualquer elogio do seu repertório. Fica a dúvida: o que será autêntico no comportamento do “Senhor Simpatia”? Difícil saber, porque estamos ensinando muitas técnicas de como fazer para parecer algo que não se é e esquecemos do mais importante que é ser aquilo que se parece. Você quer parecer simpático ou você é simpático? Você quer passar a impressão de ser competente ou você é competente? A sua rede de relacionamentos é de pessoas com quem você se importa ou apenas de pessoas que importam para você? Para tudo existe uma técnica de como fazer para parecer ser, muitas vezes, o que não se é. Pode-se encontrar informações sobre as técnicas de como dar um abraço para que ele pareça verdadeiro sem que a pessoa queira dar um abraço verdadeiro. Existem as técnicas para dar um aperto de mão que passe a impressão de ser respeitoso, de parecer amistoso e de exibir força sem que haja respeito, amizade ou força. E não para por aí. Ao preparar alguém para se candidatar a uma vaga de emprego, nós ensinamos como o candidato deve se comportar na entrevista para falar aquilo que o entrevistador quer ouvir e não para exibir a real competência para a vaga.
Assim seguimos ensinando e aprendendo técnicas para se passar uma determinada impressão sem a real preocupação em ser aquilo que se aparenta ser. Com isso, vive-se um momento em que o único comportamento autêntico, de muitas pessoas, é a falsidade.
Particularmente, acredito que as técnicas que aprimoram o desempenho em qualquer área são importantes para que sejamos mais educados, e isso se aplica às relações sociais. Podemos e devemos usar todos os recursos comportamentais e tecnológicos para melhorarmos as nossas relações sociais e profissionais. Entretanto, penso também que as técnicas devem ser complementares ao sentimento, à emoção e à vontade de se relacionar, que devem autênticas. Transfere-se, desse modo, autenticidade à imagem que se passa por meio da técnica. Por isso, é bom parecer autêntico, mas é fundamental ser autêntico.
É possível melhorar isso no ambiente organizacional? Se é possível ser autenticamente falso, é muito mais fácil ser autenticamente verdadeiro. Basta que as pessoas sejam transparentes no processo de contratação, nas formas de comunicação, na atribuição dos papéis e das funções, nos processos de treinamento e desenvolvimento e até no momento do desligamento. Autenticidade com respeito permite que cada um seja autenticamente verdadeiro.
Moacir Rauber
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